APRENDENDO NO E COM O CAPS (CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL)

Trabalhar em CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) é cansativo e desgastante, mas também pode ser muito prazeroso e uma fonte de novas e incríveis descobertas. Aprende-se demais trabalhando em um CAPS. Aprende-se a viver e a se conviver em grupo. Todas as pessoas, sem exceção, loucas ou sãs, são a um só tempo sujeitos simples (devido às suas singularidades e individualidades) e sujeitos compostos. Somos sujeitos que nos compomos em diversos substratos com a finalidade de socialização. Muitas vezes, ao olhar da maioria, a forma como se dá esse compor é inteiramente estranha e alheia a inúmeras pessoas e, assim, acabam por isolar indivíduos que possuem uma forma diferente das suas de viverem a vida, de se comporem em meio à multidão.

Esse é o dia-a-dia do CAPS. Uma junção e desjunção do diferente, do distinto, do estranho e do absurdo, como diriam muitos. Prefiro chamar de heterogeneidade e de autenticidade. Sim, creio que o termo autêntico seja o mais adequado para tais pessoas. Essas pessoas loucas que em suas loucuras nos assustam e nos causam estranhamento. Mas por quê a estranheza? Por que todo esse susto? Afinal somos todos da mesma espécie, a humana. Então por que o assombro?

Pela pouca experiência que tenho como psicólogo de um CAPS (1 ano e 6 meses), os loucos são os verdadeiros símbolos da coragem, da verdade, da honestidade e da sinceridade. Eles não se escondem e nem dão meias voltas. Não. Quando têm algo para dizer falam na lata, na cara. Doa a quem doer. Goste ou não goste. Para eles isso não faz diferença alguma. Conhecendo-os melhor e confiando neles (e isso eles percebem como uma nitidez inabalável) além de se dispor a conviver perto deles tudo fica mais fácil, eles se mostram afetuosos, companheiros, nos mostrando outros caminhos que nós mesmos somos, na maior parte do tempo, incapazes de descobrirmos sem ajuda. Eles se conhecem muito bem e a nós também.

Se por um lado julgamos que a eles falta sanidade, a nós, vos digo, falta-nos in-sanidade. Se louco é aquele que está na desmesura das emoções, aquele que as exacerba e as demonstra em grande nível para o sistema social vigente "normal" é aquela pessoa que tem absoluto controle de si, de suas emoções, das expressões de seus sentimentos, como dizemos, pessoa extremamente racional. Alguém que sente, mas vive como se nada sentisse. Expressar, portanto, significa sinal de fraqueza e num mundo globalizado e, selvagemente, competitivo mostrar o que se sente chega a ser inconcebível e inadimissível. Senão constrangedor. Então, total controle dos sentimentos e das emoções.

Não teria, por acaso, havido nesse caso uma total inversão de papéis e valores? Quem é verdadeiramente louco: aquele que, sem se ater a normas, expressa tudo o que sente e tudo o que o emociona e que se sente livre para isso ou, por outro lado, é aquele que seguindo cada passinho das normas éticas da conduta humana em sociedade se prende às crenças, valores e normas desta última sem ter o mínimo de prazer em desfrutar a vida de forma livre que é um direito que lhe compete?

OBS: Este texto foi publicado originalmente no blog Com-Versando cujo endereço segue abaixo:

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Tiago Curralo
Enviado por Tiago Curralo em 05/10/2010
Código do texto: T2539349
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