Minha doce menina de branco

Me lembro quando a conheci, ou senão do primeiro momento que me vem a mente : estava de branco, vestindo a farda de sua escola. Fazem anos já, o tempo passou, mas aquela primeira impressão era de uma menina determinada, que sabia o que ia ser e fazer de sua vida. Seus cabelos negros contrastavam e faziam bem a sua pele alva e macia. Olhando para ela, ou a conheçendo um pouco melhor, já se podia ter uma idéia que uma líder estava amadureçendo dentro daquela mente e corpo. Era bela, de uma beleza cativante. Seu olhar perspicaz colhia todos os movimentos ao seu redor e deixava transparecer uma inteligência rara. Acho, agora, que o somatório de todos estes atributos me chamou a atenção.

Bem, creio que esta noite fiquei com vontade de retratá-la, como um pintor diante de uma tela em branco. A inspiração vem quando menos se espera ou quando uma imagem viva brota na mente do artista. Pode ser uma saudade, uma lembrança que se sobresai dentre tantas outras. É um momento único que não pode ser perdido, tem que ser captado, ornado, aprimorado e pincelado em telas ou em fohas de papel.

Ela era um contraste: alegre e sofrida, cheia de sonhos e ao mesmo tempo sem acreditar que eles pudessem se realizar. Tinha um talento raro para falar em público e quando exercia este dom, prendia a atenção de todos. Mas também sabia se isolar, se colocar quieta, introspectiva, como se mil pensamentos pudessem fluir simultaneamente em sua mente. Creio mesmo que uma poeta morava ali dentro daquele coração.

Foi ai que a conheci. Tudo parecia ser casual, mas o que parecia ser acidental deu lugar a um sentimento novo e espontâneo. Talvez porque eu me enxergasse nela, nos tempos da minha juventude, quando a vida ainda não tinha me moldado a ser uma pessoa comum, sem brilho. Talvez porque sua vivacidade me desse ânimo para seguir em frente. Bem de qualquer forma um vagalume no meio da escuridão da noite sempre chama a atenção.

Nos tornamos amigos. Compartilhamos bons e alegres momentos juntos. Havia sempre um cenário novo diante de nós: praias, coqueiros, jangadas, mar, brisa, tardes, manhães e noites. Eram sempre construtivas para mim estas horas, pois usufruia e sorvia da preciosidade daqueles momentos, como um sedento à beira de um rio. Este tempo me levou a conhecê-la melhor: seus dilemas, dúvidas, medos, lágrimas e sonhos. E quem não sonha? Seus sonhos pareciam viagens bem detalhadas de um viajante experiente. Amava os continentes e se sentia atraída a prescutá-los. Creio mesmo que ela queria espalhar e derramar a si mesma nas quatro direções: norte, sul, leste e oeste.

Bem, mas esta noite a saudade chegou. O primeiro amor se dissipou e um vazio chegou. Sei que nós humanos mudamos, somos modelados pelo tempo e pelas circunstâncias, somos esculpidos e forjados no fogo da vida. Sei também que pessoas entram e saem de nossas vidas, como numa estação de metrô. Mas algumas são especias, chamam a atenção, deixam marcas, imprimem um significado novo no nosso interior. Mas o que fazer desta saudade? Compor uma prosa, um conto, uma crônica, fazer de conta que tudo não passou de um verso dentro de um universo?

O tempo cura as feridas da alma. O tempo é aliado do soldado ferido na batalha. O tempo é o único recurso do poeta. Mas o tempo não apaga o amor, porque o amor é mais forte que a morte. E pelo amor somos diferentes de todas as outras criaturas que vivem neste planeta. Mas o amor, segundo a Bíblia, é sofredor, benigno e se alegra com a verdade. Amar não é paixão, não é loucura.

Amar também é abdicar do amor.

Quem sabe um dia voltarei a vê-la? Numa rua qualquer, de um dia qualquer, numa coencidência qualquer, mas com certeza não será uma coisa qualquer. Ela me fez bem e não mal. Ela entrou e saiu de minha vida, pegou o trem e seguiu adiante para a próxima estação. Não se despediu, apenas foi embora.

Só me resta seguir meu caminho, espalhando e derramando por onde for um pouco do que aprendi com ela. Ficaram marcas, impressões, detalhes que me ajudarão a ir adiante. Posso dizer obrigado!

Esta crônica vai fazer parte do meu livro, vai fazer parte da minha história. Dentre muitas poesias será uma das mais belas. Espero que ela encontre o que sempre procurou. Que não desista de seus sonhos, de sua oração, dos seus continentes, do seu chamado. Que seja feliz, que seja amada. Que seja livre de toda amargura da alma, da dor e da solidão. Que brilhe como as estrelas no firmamento!

Chegou a hora do ponto final. Do final da história, da crônica, desta saudade!