A MALDIÇÃO DO CADASTRO

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Sou viciado em sandálias de couro. Não dessas sandálias um tanto afrescalhadas, mas as do tipo franciscanas. Bem, a minha sandália de todos os dias, estava a pedir aposentadoria. Resolvi, então, com certa relutância, aposentá-la e buscar outra na loja. Então, lá vou eu para o shopping, levando a mulher a tiracolo para dar pitaco na hora da compra.

Entramos na loja e logo me vi no papel de uma alta personalidade, embora estivesse simplesmente vestido, entrando num recinto de aduladores, tal era os elogios do vendedor - após o cumprimento cordial - a minha velha sandália, ao meu vestuário, enfim ao meu bom gosto e etcetra. Quer saber, era notório o doloroso esforço de sinceridade dele.

Escolhida a sandália, que por sinal era quase idêntica a outra, e consumada a intenção de comprá-la, as gentilezas foram ladeira abaixo. E no caixa começou o tormento do cadastro.

— Minha senhora, eu vou pagar com o cartão, porém, a vista, por isso, não vejo a necessidade de cadastro, implorei.

— Senhor, em princípio, preencher cadastro é opcional, mas em nossa loja é obrigatório, mesmo que se pague em dinheiro vivo. É regra da nossa sede em São Paulo. Não conseguimos processar nenhuma venda sem o cadastro.

E eu ansiando o rápido anonimato de uma compra efetuada com o cartão de crédito, e ela a me dizer isso.

— O nome completo do senhor; profissão; data de nascimento, só dia e mês - esclarece carinhosamente a moça do caixa. Casado? Solteiro? Nome da Esposa, Endereço, telefone residencial, comercial, celular, CPF, RG, e-mail. Têm filhos? Quantos? O nome deles...

— Espera aí, senhora! Esse cadastro está ganhando contornos de tortura! Só falta você me pedir o nome de minha cachorra porque eu a trato como filha!

— Senhor, tenha calma!... Vou fechar o cadastro, embora ainda faltem alguns itens que preencherei depois...

Esse depois não me soou bem, mas como estava louco para sair dali, deixei-o num cantinho da cabeça, piscando, como advertência.

E não é que eu estava certo. Ao ser cadastrado, passei a receber telefonemas, muitos telefonemas... Os primeiros para preencher os itens faltantes, depois os de felicitações: dia dos pais, das mães, das crianças, aniversários e etcetra. Além disso, passei a receber avisos, muitos avisos... De lançamentos, de promoções, de descontos, de créditos e muitos, muitos convites para visita a loja.

Pois é, “por causa” de uma sandália de couro, de um dia para outro passei a ser vitima da maldição do cadastro.

Salve-se, quem puder! ®Sérgio.

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Se você encontrar erros (inclusive de português), relate-me.

Agradeço a leitura e, antecipadamente, qualquer comentário. Volte Sempre!

Ricardo Sérgio
Enviado por Ricardo Sérgio em 24/09/2010
Reeditado em 03/06/2013
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