Rascunhos de Um Pensar - Parte 08

Uma coisa que deve ser notado é que o Nada é totalmente individual, solitário e egoísta e exige o mesmo de você. Não há como generalizar, compartilhar ou distribuir o Nada. Ao se procurar o Nada você vai procurá-lo dentro de você mesmo. É o choque da negação de seus próprios sentidos, aquilo que o atrela ao mundo conhecido, que lhe mostrará a Nada. Você terá que aprender que o que seus sentidos trazem para você é tão real quanto queira e tão imaginário quanto você permita. Assim, você tem que primeiro sentir para depois deixar de sentir... e só você pode fazer isso e isso só pode ser feito procurando dentro de você mesmo.

A boa notícia é que pode ser feito em partes, você pode trabalhar cada um dos seis sentidos individualmente e assim conquistar um pouco do Nada de cada vez. Muitas vezes é até recomendável que se faça assim. A experiência de conhecer o Nada de uma única vez pode ser perigosa e sem retorno.

Você pode começar negando o tato. Se você foi um bom estudante de física lembrará que ao tocar alguma coisa você nada tocou. O tato nada mais é que os campos energéticos de sua matéria interagindo com os campos da matéria que você “tocou”, criando forças que sua mente traduziu em toques. Lembre-se: a matéria é a poeira que macula o Nada.

Há duas maneiras básicas de se negar o tato. Você pode simplesmente bloquear as interpretações do seu cérebro e simplesmente não sentir o que deveria estar sentindo. E isso é mais fácil do que parece. Você pode fazer isso sem buscar o Nada. Segure algum objeto, de leve, sem muita força. Pode ser algo simples, pode ser sua própria mão segurando a outra. Não se mexa. Não altere o toque. Deixe o tempo passar. Daqui a alguns instantes conscientize-se de que na verdade você não está mais sentindo toque nenhum. Seu cérebro bloqueou a sensação.

A outra forma, a que interessa, é concentrando-se- no Nada. E conscientemente bloqueie suas sensações de tato. Recomendo que comece deitado, fica menos assustador ou perigoso. Vá esquecendo que tem pernas, braços, pele... Vá deixando que suas partes passem a fazer parte dos objetos que você “toca”. Você nada mais sente porque você nada mais é que um nada se integrando ao nada dos objetos. A sensação de peso, de contato, de espaço ocupado desaparece. Quer voltar a sentir? Basta querer. Mexa-se... isso bastará. Que tal o passeio?

Vamos para o segundo sentido... que tal a audição? Aqui a essência é diferente. Aqui você tem que se conscientizar que ouvir é acreditar na sequência do tempo. Você só ouve hoje porque acredita que exista um processo de receber a informação, traduzi-la, interpretá-la e usá-la ou armazená-la. Mas processos pressupõem tempo e espaço, que já sabemos serem frutos de nossa desimaginação. Quer parar de ouvir? Inunde sua sensação auditiva com o silêncio do Nada, com a incapacidade de entender o que venha a ser tempo ou espaço. Comporte-se como se nada houvesse para ser ouvido. Faça de conta que está indo dormir e deixe a audição descansar. Verá que sem a audição a noção de que o tempo e o espaço não existem passa a ser mais crível. É como ter uma televisão ligada sem volume e você não querendo prestar atenção. Parece que nada de verdadeiro está acontecendo. É verdade que se você usar a visão e o pensamento em uma televisão sem som, você vai se apegar ao “realismo” e à passagem de tempo, mas como estamos nos livrando dos grilhões dos sentidos, tente deixar a televisão ligada sem som e sem sua atenção. É como estar numa exposição de pinturas sem querer ver quadros. Ao final do seu passeio você terá entendido o quero dizer por não existir tempo ou espaço.

Qual o próximo? Olfato? Ou prefere paladar? Esses são fáceis nos dias de hoje porque eles já estão semi-destruídos pelos hábitos e exageros que aceitamos.

O olfato sensível, aquele de pequenas nuances praticamente já não o temos, mas ainda somos capazes de sentir os grandes extremos, prazerosos e asquerosos. Ajuda lembrar que aprendemos a sentir cheiros como uma forma de sobrevivência, onde as classificações de bom e ruim nasceram de memórias educativas e fisiológicas que herdamos. Se conseguirmos desvencilhar o elo entre o cheiro e o fato, aprenderemos a sentir os cheiros sem reações comportamentais. Este é um passo importante para simplesmente deixar de sentir qualquer cheiro. Feito isso, comece a entender que o olfato não existe. Ele é tão real e tão falso quanto o tato. Ele é apenas uma série de reações químicas que você decidiu lembrar e valorizar.

George Wootton
Enviado por George Wootton em 24/09/2010
Código do texto: T2518485
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