Olhai os Lírios do Campo...***
"Olhai para os lírios do campo, como eles crescem: não trabalham, nem fiam. Eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles" (Mateus 6:28-29).
Um dia desses ao abrir um antigo álbum tive o prazer de rever velhos amigos...
As fotografias envelhecidas pelo tempo...quase sem cor me levaram a percorrer uma época muito divertida em minha vida... um tempo cheio de descobertas...
Amigos do colégio... da vizinhança... pessoas que seguiram seus caminhos e que deixaram em mim um rastro de saudade...
Entre elas estavam Maria Elisa e Marco Aurélio, duas pessoas muito diferentes... mas, com alguns pontos em comum...
Ela:
Uma menina de classe média, dona de uma personalidade arrogante e por vezes debochada...
Elisa não era uma pessoa ruim, apenas não sabia atribuir valores... e costumava julgar o livro pela capa, sem ao menos se preocupar em conhecer o conteúdo...
Dona de um repertório fora do comum, minha amiga às vezes conseguia a façanha de tecer comentários ácidos sobre a aparência das pessoas... como se ela fosse a própria Afrodite.
Muitas meninas evitavam sua companhia por se sentirem diminuídas diante de seu olhar severo.
Ele:
Um menino pobre, determinado, fiel às suas convicções, acreditava que um dia seria um profissional de sucesso
Marco, tinha um grande poder de persuasão e na maioria das vezes representava seu grupo nos trabalhos de escola, aumentando assim sua popularidade entre os amigos.
Algo em comum entre eles:
Um amor secreto sufocado pelo orgulho.
Naquela época os bailes de garagem eram muito comuns, e gerava uma grande expectativa entre as meninas e os rapazes... pois, era a oportunidade da paquera... mas, também motivo de muita frustração para quem possuía o estigma de “patinho feio”.
Marco nunca participou, pois, não se sentia confortável, afinal, enquanto todos desfilavam roupas de marca... meu amigo revezava entre um e outro jeans surrado.
Lembro que houve uma gincana no colégio e para comemorar a vitória de nossa equipe, a professora Rosa resolveu fazer uma festinha... o que incluía a turma toda. Dessa vez ele não teve como escapar...
Uma seleção de música lenta encorajou meu tímido amigo a convidar Elisa para dançar...
Mas, qual não foi a surpresa de todos ao ouvi-la dizer em alto e bom som:
“Marco você não se enxerga? “
Ele baixou a cabeça e saiu da festa sem dizer uma palavra. Ela no mesmo instante se arrependeu, mas já era tarde demais...
Com o tempo o episódio foi esquecido pela turma, mas, a distância entre ambos cresceu extirpando qualquer possibilidade de florescer o amor secreto...
Anos depois, soube através de Ricardo, irmão do Marco, que ele se formou em Engenharia Elétrica e se tornou consultor técnico numa grande empresa no ramo de automação.
Lembramos a triste cena do baile, e então Ricardo me contou que Marco e Elisa se encontraram num Congresso. A moça arrogante deu lugar a uma mulher madura e menos preconceituosa devido às lições que a vida nos dá.
Elisa reconheceu o rapaz de jeans surrado, agora trajando um terno impecável, belos sapatos e de futuro promissor...
Ele a cumprimentou de forma gentil e calorosa. Imediatamente ela informou que havia terminado o noivado, e sugeriu um outro encontro para relembrar os velhos tempos e quem sabe algo mais...
Nesse instante ele apenas acenou com a mão esquerda deixando a mostra a bela e polida aliança, e disse num tom carinhoso que foi muito bom revê-la, mas, que a vida escreveu para ele uma nova e feliz história, onde ela só poderia ser uma boa amiga.
*Certa vez ouvi dizer que o mundo dá voltas... e voltas completas!!!
Às vezes a arrogância e o despreparo propiciam julgamentos e atitudes ruins... mas, mesmo assim há aqueles que confiam e não se deixam abater...e num gesto de dignidade conseguem dar a maior de todas as lições...
Grande não é o homem que vence pela força, e sim aquele que com garra e determinação alcança seus sonhos sem jamais perder a doçura...