No silêncio da sala quebrado tão somente pelo ruído do ar-condicionado; na penumbra à luz do data show, uma atmosfera poética nos envolvia... e, nesse clima de magia, contritos estávamos. Bebíamos de cada interpretação poética; das performances apresentadas.
Discutíamos análises textuais -lindas, maravilhosas -, desde Safo à Cazuza; desde o Renascimento, onde surgiram as primeiras poetisas, das quais, a francesa Louise Labé (a bela cordoeira), modernismo, pós –modernismo e a “ecriture féminine”contemporânea - estrangeira e brasileira - e, a corajosa “ARTE QUEER.”

Surge um texto maravilhoso da “Contemporânea Adélia Prado.” Alguém começa a declamá-lo com muita propriedade...

CASAMENTO
(Adélia Prado)

Há mulheres que dizem:
Meu marido, se quiser pescar, pesque,
Mas que limpe os peixes.
Eu Não. A qualquer hora da noite me levanto,
Ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
De vez em quando os cotovelos se esbarram,
Ele fala coisas como “este foi difícil”
Prateou no ar dando rabanadas
E fez o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos pela primeira vez
Atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
Somos noivo e noiva.

– Bem, daí por diante, foram várias às interpretações. Percebi a verdade contida na minha frase: “Cada um dá o que tem e recebe com o coração que tem.” Pasmei! Alguém se fez ouvir:
– “Essa mulher precisa acordar!”– E, a turma do “Maria vai com as outras,”ratificou a equivocada análise. Ouvi ainda:
– “...E, depois de limpar os peixes, ainda foram pra cama...”

– Foi quando um Dr. em Literatura ressaltou um fato conhecido por quem - da mesma forma que eu - admira Adélia Prado e, sabe muito bem, não ser ela “Amélia.” Disse o poeta, o doutor: “ É preciso que saibamos que a literatura de Adélia Prado é centrada na sua fé, ela é cristã confessa!”

– A que ponto chegamos!
Quanta confusão nas mentes tidas por literatas.
O contexto do poema de Adélia, nada tem a ver com Deus e, tudo tem a ver, à partir da premissa de que, “Toda boa dádiva, todo dom perfeito, vem do alto do Pai das luzes, onde não há sombra nem variação.” Bíblia Sagrada

–Como aceitar o casamento, como que, uma "instituição falida,”onde cada qual, deva transformar a própria “independência” em arrogante individualismo e auto-suficiência em todos os sentidos - descartando a idéia de companheirismo e de cumplicidade - comumente existente, não só no casamento, porém, em toda boa relação - enquanto essa existe?

Analisando o contexto poético de Adélia chego à conclusão lógica de que, primeiramente, de forma sutil, ela critica a mulher e esposa que não sabe ser companheira, partícipe e cúmplice de todos os momentos comuns, do /ou com o seu cônjuge; com a mesma sutileza dá a receita para uma relação duradoura e feliz: companheirismo, respeito mútuo pois, “acabou o respeito, acabou o amor.”O amor foi e será sempre, tal qual, uma plantinha que precisa ser regada e cuidada diariamente.

Sejamos femininas mesmo sendo feministas.

A fêmea seduz, joga com sutileza, mestria, candura, se compraz em ser possuída e deixando-se possuir...Possui!
Lida bem com política, causas sociais, cheiro de peixe... Sabe ser isca e anzol; sejamos Adélias e Amélias...
Femininas e feministas!


EstherRogessi.Escritora UBE.Mat.3963.Analiticamente Falando.Imagens Web. Arte By Estherrogessi.22/09/10.


EstherRogessi
Enviado por EstherRogessi em 22/09/2010
Reeditado em 01/12/2012
Código do texto: T2513575
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