Paraíso
Paraíso poderia se chamar "onde eu moro", mas não é esse o nome. Dias diferentes sempre foram difíceis de ser vividos aqui nessa pequena vila de pescadores que foi crescendo. Já havia virado rotina, eram as mesmas coisas todos os anos. Quando criança tinha muitos amigos. Vivia correndo pelas ruas, jogando bola, subindo nas arvores, brincando de esconde-esconde. Tudo tão interessante. O primeiro beijo, as brincadeiras de salada mista e verdade ou conseqüência. Eu era tão nova e já estava descobrindo um pouco da vida. Era sempre tão bom está com aquelas mesmas pessoas, eu nem sabia que elas um dia iriam embora.
Um dia como outro qualquer, em um domingo normal, acordei aos gritos da minha mãe pedindo por socorro. Eu entrei em pânico, não entendia o porquê de toda aquela gritaria. O porquê de toda aquela agitação. Fiquei sem entender por alguns instantes...
Era fria a noite anterior, era sábado, passava um bom filme na TV e eu havia decidido ir dormir na sala. Quando acordei na manhã do dia seguinte eu descobri que tinham arrancado parte do meu coração, quando entrei no meu quarto, eu entendi o porquê de toda aquela agitação. Minha irmã estava muito mal, me perguntei rapidamente: “mas porque minha irmã? Ela é tão boa, tão cheia de saúde,sempre com um sorriso no rosto"! Por que Deus tinha decidido levar ela, logo ela? Naquele momento em que eu a vi se debatendo naquela cama entrei em desespero. Minhas pernas tremiam, escorriam lágrimas de meus olhos, eu não sabia o que fazer. Minha mãe então me mandou chamar alguém pra ajudar. Mas minhas pernas não obedeciam minhas ordens. Até então, corri. Fui chamar meu tio, mas como eu diria pra ele algo tão inesperado? Então, deixei meu coração falar e gritei com voz de desespero: "Me ajuda, minha irmã está morrendo"! Ele correu e ajudou meu pai a levar minha irmã para o posto de saúde. A levaram em um buggy ...No lugar onde eu disse que poderia se chamar “paraíso” não tinha ambulância, nem mesmo assistência médica. Quando chegaram ao posto, ela deu seu “último suspiro” e não aguentara mais. Ela morreu, mas onde eu estava não sabia o que havia ocorrido. Quando a levaram fiquei cheia de esperanças que ela voltaria pra casa dando aquela gargalhada memorável. Todo mundo foi chegando aos poucos, gente e mais gente, o telefone tocava. Eram amigos, conhecidos, pessoas de longe. E mesmo assim já sabiam do que estava acontecendo. Atendi inúmeras ligações sem saber o que dizer, mas a ligação que eu tanto esperava não chegava: “a ligação do meu pai” . Porém ele já tinha ido pra Jijoca, Acarau, Fortaleza e nada do telefone tocar. Nada deles chegarem. Fiquei na calçada, sentada e quando eu escutava o barulho de um carro me levantava rapidamente pra ver quem era. Uma tarde quase toda nessa angustiante espera...
O telefone, enfim, tocou. Minha tia atendeu. Eu já não tinha mais forças pra falar com ninguém, mas era meu pai. Eles se falaram por alguns minutos e a ligação foi finalizada. Ela desligou e, com lágrimas rolando pelo seu rosto, disse: ”não,ela não...” Minha mãe entrou em choque, passou muito mal, sua pressão baixou a doparam. E eu? E meus irmãos? O que faríamos? Eu não sabia o que fazer, pra onde ir, apenas chorei...Sempre imaginei aquele tipo de situação com os outros, não comigo,como aguentaria viver sem ela? Como suportaria tudo aquilo,como estava suportando ?
Só Deus mesmo, mas porque Ele tinha sido tão ruim? Eu não O entendia. Não conseguia entender... Eu olhava pra tudo e procurava achar o significado de tudo aquilo. Nada fazia sentido. A minha direita, gente chorando. A minha esquerda, também. Vivi dias horríveis, mas com o passar do tempo aprendi a lidar com a dor e a saudade. Fui entendendo o que, naquele momento, não conseguia entender. Hoje sei que estamos aqui só de passagem e que minha irmã está um lugar que realmente se chama “paraíso”.