CRÔNICA - Corrupção no Palácio do Planalto

 

            As notícias sobre as últimas falcatruas patrocinadas pelos do governo chegam a estarrecer àqueles que têm pelo menos um pouco de cidadania no sangue, no coração e na alma de brasileiro.

            Primeiro, isso falando em casos recentes, foram as quebras de sigilo das declarações do imposto de renda da filha do José Serra, candidato à Presidência da República; depois, de seu genro e de colegas do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), cujas apurações não vão chegar a lugar algum e quem vai pagar o pato é aquela funcionária do pequeno escalão; disso todo mundo sabe, pois quando a brava Polícia Federal entra em cena as coisas demoram pra valer e embora faça um trabalho de qualidade, eles se perdem nos escaninhos do governo e ninguém graúdo paga a conta.

            Agora, mais recentemente, aparecem as safadezas dentro da Casa Civil, cuja ministra é a segunda pessoa do senhor Lula e seu gabinete é praticamente anexo ao dele (claro que de nada sabe e nunca viu coisa alguma), com fortes indícios e provas de que a utilização de cargo público para beneficiar pessoas da corja e parentes com empregos sem concursos e propinas em dinheiro vivo para intermediar negociações, pleitos de pessoas perante organizações públicas. Essa doutora Berenice sempre fora a corda e a caneca da Dilma desde muito tempo. Será que aprendera com ela?

            Fica claro que esses elementos que entram na vida pública sem concurso, por mera confiança do dono da bola, não têm qualquer compromisso com a moralidade e com o zelo das coisas de interesse do governo e do povo, eis que não sendo concursados não vislumbram nada a perder, salvo o cargo temporário que abiscoitam; mas no governo seguinte eles voltam e ficam aí de pernas pro ar a roubar novamente a confiança que lhes fora depositada. O doutor José Dirceu, que fora cassado da Câmara dos Deputados, está dando ordens na campanha presidencial da ministra Dilma Rousseff, é o pai da matéria.

            Meu amigo Nobre, o que você acha de tudo isso?

-- Sabe, rapaz, eu tenho verdadeira ojeriza a quem não zela pelo que é do povo, da massa, e joga o cargo pro alto em troca de comissões, propinas em dinheiro, em presentes ou mesmo de cargos públicos, até por que quem paga a conta são os bolsos dos cidadãos que recolhem impostos, não esses miseráveis do “bolsa família”, que não têm querer, são obrigados a pagar ao governo com seus sufrágios certos, como no tempo dos coronéis.

-- Você trabalhou trinta anos em empresa do governo...havia casos de propina, bola, toco ou o que fosse para beneficiar pessoas físicas ou jurídicas?

-- Olha, em qualquer lugar existe gente descompromissada com o bem e deseja ficar rica a qualquer custo, mas as notícias de desvios eram poucas; todavia, quando o banco sabia dessas ocorrências deixava o cara em "banho maria", isso até que possuísse a prova cabal de sua conduta, e nessa hipótese lhe acenava com três alternativas: ou pede demissão, aposentadoria, ou será demitido. Claro que nunca concordei com esse sistema, eis que lugar de bandido é na cadeia e a demissão seria a melhor medida. O banco fazia assim para não acabar com a vida do pilantra, pois uma demissão por justa causa mancharia seus antecedentes e nunca mais arranjaria emprego, pelo menos em entidades de respeito.

-- Eu soube que você fora cantado várias vezes a receber propinas e coisas que o valham; isso foi verdade?

-- Foi, não, é verdade sim. Olha, quando eu trabalhava numa grande cidade do nordeste, na Paraíba, um polo comercial dos melhores, a agência só operava com um grupinho de pessoas do coração do gerente; até um secretário particular, cargo que nunca existiu, foi inventado para cuidar das coisas do titular da agência; ele mandava e desmandava, inclusive o cidadão só fazia empréstimo se ele o aprovasse, e nisso as comissões corriam adoidadas para ele e o seu compadre, primeiro gestor. Uma vergonha, e eu pensei: Como é que o banco, sabendo que sou novo ainda na Casa, me manda para uma desgraça dessas! Quer me testar ou me promover definitivamente? Era assumir, resolver os problemas ou largar...

-- Mas e você...

-- Bem, primeiro é bom notar que assumi as funções num mês de março, ou seja, a três meses do próximo balanço; o gerente era um semi-Deus na região, um bom rapaz, porém as notícias eram que ele andava no bolso de fregueses ricos. Verdade que ele fora transferido para outra cidade até de maior porte, promovido, e eu assumi no seu lugar. A primeira coisa que fiz foi dizer ao secretário, um bajulador de primeira grandeza, que ninguém poderia voltar da mesa dele sem ser atendido pelo banco, ou seja, a palavra final era minha. Ele estranhou de logo a medida, o subgerente veio em sua defesa, aí eu exerci o poder do cargo e os enquadrei numa boa, sem aquela de dizer: Aqui quem manda sou eu, pois quem tem moral não precisa se utilizar desse chavão. Quem o pronuncia é porque não manda em porcaria nenhuma.

Depois de certo tempo chegou à agência um inspetor para apurar o porquê de aquele secretário estar na função arranjada por quase dez anos. Quando me fez a pergunta respondi de pronto: Ele já entrou no rodízio e agora trabalha no setor de funcionalismo, meu caro. – Então meu trabalho aqui não tem mais sentido, você já resolveu tudo, dissera. – É isso que o senhor ouviu. – Vou comunicar à Direção Geral, um abraço, passe bem. – Tudo de bom pro senhor, respondi.

-- Mas Nobre, até agora você não me respondeu sobre propina...

-- Isso foi só uma introdução, meu amigo. Como dizia, assumi no mês de março. Pois bem, a partir do segundo dia de trabalho uma firma que beneficiava leite começou a mandar esse precioso líquido pra minha casa, sempre acompanhado dos queijos que também fabricava. A minha mulher, que rezava na minha cartilha, embora não entendesse certas atitudes minhas, me comunicou sobre o fato. Pois bem, procurei saber o preço desses produtos e comecei a depositar na conta da empresa o valor pertinente, guardando os competentes recibos para uma futura ocorrência não muito saudável. Eu desconfiava de que ele fosse começar a me pedir favores que as instruções do banco não permitiam.

Demorou um pouco mais, eis que depois do São João, num dia desses qualquer, por volta das 18.00 horas, quando eu acabava de chegar do trabalho (até parece que o portador estava me esperando), entra um senhor com um aparelho de televisão em cores, encravado num móvel de alto gabarito, coisa muito chique, até porque o meu era pequenino e em preto e branco. Entrou, com aminha licença, fez a montagem daquele joia e foi embora. – Foi o seu Hilário quem mandou. – Muito obrigado, dissera eu.

Os dias passam, a minha mulher me falou que aquilo era coisa normal, todo mundo recebia, que eu deixasse de ser besta, isso na maior pureza de sua alma. – Sabe, linda, a minha formação doméstica e bancária não me permite receber presentes tão caros. – E o que você vai fazer com isso? – Muito simples, devolver não seria de bom grado, mas sim uma desfeita, daí vou doá-la a uma instituição. – Bem, você é que sabe, respondeu-me.

Compareci à Loja Maçônica Regeneração Campinense nº1 e em contato com o Venerável Mestre, um senhor de alto respeito, e demonstrei a vontade de fazer da televisão um presente para que os mações pudessem assistir, antes do início de suas reuniões fechadas, ao Jornal Nacional, por exemplo. – O senhor aceitaria, Venerável? – Com muito prazer senhor Nobre. – Sabe, isso foi um presente que mandaram pra minha casa, todavia não posso aceitá-lo. – O senhor está fazendo a coisa mais certa do mundo, um gesto nobre. – Pode o Venerável assinar um recibo do aparelho? – Exatamente. E assim o fizera. De tudo, mandei cópia para a administração superior.

-- Mas e então, isso ficou assim mesmo?

-- Coisa alguma. O cidadão andou me propondo umas operações de crédito que não se enquadravam nas instruções regulamentares da empresa. Mandei fazer o estudo assim mesmo, todavia indeferi as propostas; aí já viu o bafafá. O cara começou a mexer os pauzinhos com o pessoal de Brasília, para quem mandava presentes de vez em quando e nos finais de ano, no natal. A pressão em cima de mim foi muito forte, e se não fosse o meu moral eu cairia com toda a certeza.

Ocorreu que ele não ficara satisfeito com minhas decisões. Compareceu ao meu gabinete e protestou veementemente. – Nobre, o outro gerente fazia esses negócios comigo, com a minha firma. – Ocorre que eu não sou o outro gerente, sou o atual e não posso fazê-lo. – Mas o banco é um só e se o senhor acha que eu não tenho direito envie as propostas para a diretoria em Brasília (o pessoal já estava conversado). – Pois bem, entre com um recurso que eu o farei; mas antes eu gostaria de lhe dizer que se está fazendo isso com base nos presentes que me mandou, pode tirar o cavalinho da chuva, pois quanto ao leite e o queijo eu todos os dias deposito na sua conta o respectivo valor; no que se relaciona com aquela linda TV, fiz uma doação a uma entidade de respeito...e lhe mostrei os comprovantes. Ele saiu rápido e bufando do gabinete que ainda levou uma topada na porta...

-- Poxa, cara, moralidade administrativa é isso aí; veja o que os nossos doutrinadores entendem sobre o assunto:

 

5 - PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA (Fonte Google).

 

            ... e,

 

"Outro é a previsão de sanções a governantes e agentes públicos por atos ou condutas de improbidade administrativa. A probidade, que há de caracterizar a conduta e os atos das autoridades e agentes públicos, aparecendo como dever, decorre do princípio da moralidade administrativa. Na linguagem comum, probidade equivale a honestidade, honradez, integridade de caráter, retidão. A improbidade administrativa tem um sentido forte de conduta que lese o erário público, que importe em enriquecimento ilícito ou proveito próprio ou de outrem no exercício de mandato, cargo, função, emprego público".

-- Muito grato, meu nobre, depois prosseguiremos.

-- Disponha, meu amigo.

 

Em revisão.


Foto: Google.


Interação de Jacó Filho, grande escritor, grato:

 

20/09/2010 09:37 - Jacó Filho

Bom dia mestre, sua crônica está excelente e exemplar... Eu fui presidente de comissão de licitação em algumas empresas, e graças a deus, sempre consegui evitar que o a cantada se efetivasse, no entanto, numa ocasião, a proponente era representada por um ex-colega e com a desculpa da amizade, me pagou uma meia dúzia de jantares, até que lhe falei com todas as letras, que se a intenção dele era ser favorecido no edital, poupasse seu dinheiro... Então ele parou, e perdeu o contrato, não por isso, mas por não ter a melhor proposta... Parabéns! E que Deus nos abençoe e nos ilumine... Sempre...

Para o texto: CRÔNICA - Corrupção no Palácio do Planalto (T2508739)

 

Interação da grande Giustina, grato:

 

 

20/09/2010 18:45 - Giustina

É meu amigo, se a gente fosse escrever sobre todas as falcatruas que ocorrem no nosso "Brasil varonil", não iria ter espaço suficiente em todas as páginas do RL. Eu, sinceramente, estou enojada com a eleição deste ano! Disseste uma coisa que me chamou a atenção: é com relação a concursos públicos para cargos importantes. Concordo plenamente. Essa história de Ccs arruína todo o processo. Vejo isso na área da Educação que é a minha esfera de trabalho. Parabéns pela bela crônica. Beijo grandão.

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Comentários de Raquel, que agradeço:

20/09/2010 21:30 - Raquel Cinderela as Avessas

Ansilgus um dia ouvi meus avós já idosos comentarem sobre tal política do pão e circo.Na hora eu não entendi direito o que era , mas como sou curiosa fui pesquisar e para minha surpresa eles estavam absolutamente atuais , vendo o horário político, aqueles sorrisos amarelos , pegando criançinha no colo chego francamente a desanimar,eles não falam no tema educação porque seria como dar um tiro no pé, falam de bolsa isso bolsa aquilo, devia dar condições das pessoas terem sua própria dignidade,enquanto o Brasil for o país do jeitinho e a educação não for priorizada meus avós terão razão,continuaremos sendo um povo que se contenta com a política do pão e circo. Um abraço amigo Ansilgus...Raquel.

Para o texto: CRÔNICA - Corrupção no Palácio do Planalto (T2508739)


Publico comentário da poetisa Celêdian, a quem agradeço:

20/09/2010 22:42 - Celêdian Assis

Admirável a ética e a moralidade de pessoas como seu amigo Nobre e que bom seria se aqueles que são responsáveis por administrar o patrimônio público, todos sem exceção usassem da mesma conduta. Sabemos que a corrupção é como droga, é um fosso sem fundo e quanto mais se cava, maior é a ambição. Sua crônica nos traz verdades incontestáveis. Excelente! um grande abraço, meu amigo. Boa noite!

Para o texto: CRÔNICA - Corrupção no Palácio do Planalto (T2508739)


Publico o comentário do poeta Alcir Andrade, grato:

20/09/2010 23:07 - Alcir Andrade

Maravilhosa sua crônica, e no momento certo... Todos nós estamos sujeitos às pressões e propostas nada agradáveis, e infelizmente alguns não conseguem resistir e aceitam se corromper. Ainda bem que existem pessoas como você, que não se vendem. A ficha limpa é parte da propaganda de vários candidatos, quando na verdade, a honestidade deveria ser um pré-requisito para concorrer a um cargo público. Obrigado pelo comentário na poesia REFÚGIO. DEUS o abençoe para que a honestidade seja sempre uma de suas virtudes. Abraços

Para o texto: CRÔNICA - Corrupção no Palácio do Planalto (T2508739)







ansilgus
Enviado por ansilgus em 20/09/2010
Reeditado em 21/09/2010
Código do texto: T2508739
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