Guardas Municipais, Pardais e Tais
É incrível a capacidade de políticos, ministros, e demais autoridades colocarem-se contra o povo. Vejo agora a desastrada intervenção do ministro do STF cassando a liminar que impedia a atuação da verdadeira indústria geradora de recursos, provenientes de multas de trânsito, que é a Guarda Municipal do Rio de Janeiro. Esses guardas espalham-se pelas ruas, numa voracidade sem limites, atrás da menor irregularidade que o motorista possa ter cometido. Estão sempre de bloquinho na mão. Não interessa a orientação, que na verdade teria um efeito muito mais eficaz no que concerne à formação do bom motorista. Só que a orientação não gera recursos. Com exceção da orientação de seus superiores que determinam possivelmente o número de multas que devem ser aplicadas pelo agente para que ele possa ser melhor graduado ou tenha algum tipo de benefício. Quanto maior o número de multas, maior a chance de terem alguma vantagem.
É algo parecido com a premiação que tinha ou tem o policial que mata ou prende bandidos (ou não bandidos). Quantos mais bandidos mortos, maior a premiação. Segue-se a mesma linha do “bandido bom é bandido morto”, estabelecida por políticos saudosistas da ditadura.
Já não bastam os equipamentos eletrônicos para surpreender e tarifar as pessoas de bem (porque as do mal não estão nem aí), sem nenhuma preocupação com a educação no trânsito. Muitos pardais são de cor verde e estrategicamente colocados entre a vegetação para que não sejam vistos. Ou então colocados logo na saída do túnel para que não seja possível diminuir a velocidade. Ou ainda, colocados bem junto ao semáforo para que você seja duplamente multado, isto é, se avançar o sinal e se estiver acima do limite de velocidade. Quem bater, que bata, quem morrer, que morra. O importante é a fotografia da placa e a guia de notificação chegando à casa do infeliz do contribuinte.
Estrada das Canárias, Ilha do Governador, logradouro de altíssima periculosidade a qualquer hora do dia. Local sempre ermo. No meio desta semana, por volta de 14h, havia na calçada um tripé sustentando um equipamento eletrônico destinado à aplicação de multas (um radar móvel), estrategicamente colocado logo após uma curva fechada. Local de inúmeras falsas blitzes, o que deveríamos encontrar naquela via não era pardal eletrônico, mas sim policiamento.
É lamentável que um ministro, sobretudo oriundo de um partido que se diz de esquerda (não deve ter mais nenhum), se preste a um papel destes: levar a punição a uma população já tão punida pelo desemprego, custo de vida, violência e desfaçatez com que políticos, autoridades, policiais e agora (ou sempre?) até juristas imiscuem-se em negócios de corrupção.
Rio, 14/11/2003