CHATO DE GALOCHA
Sempre me perguntei por que chamam de “chato” uma pessoa maçante, inconveniente. Não, não tem nada a ver com aquele bichinho que impregna as “partes vulneráveis” de algumas pessoas. O chato já existia antes dele.
Deve ser porque chato é um elemento plano, sem relevo, monótono. Teve boa inspiração quem inventou o termo “chato de galocha”. Até parece um pleonasmo, pois a galocha por si só já é um troço incômodo, imaginem um chato revestido dela.
A galocha, para quem não a conheceu, é uma fôrma de borracha que revestia os sapatos nos dias de chuva, para evitar que ficassem encharcados. Os pés da pessoa ficavam enormes e pesados. Quando o aguaceiro era forte, a chuva penetrava na borracha e era uma dificuldade para se caminhar.
Existe uma sutil diferença entre o chato de galocha e o mala sem alça. O de galocha, além de ser incômodo, possui ideias retrógadas, ultrapassadas, assim como a peça de vestuário que lhe empresta o nome. É o que se aferra a determinadas ideias e quer, a todo custo, impingi-las aos outros. É só bobear e lá vem ele: splash! splash! Os pés enormes espalhando água.
Já o mala sem alça é o chato moderno, aquele que nem os amigos aguentam sua companhia. Não se tem por onde carregá-lo. E não se dá conta de que sua presença não é apreciada. Tem se tornado ultrapassado, anacrônico, pois já se inventou a mala de rodinhas.
O mala é um descendente do xarope. Xarope é, ou era, para nossos pais, o camarada pegajoso, visguento, que não soltava facilmente aqueles que por ele se deixavam agarrar. Pegava um assunto e o ficava repisando, pedindo opiniões, segurando o braço do pobre interlocutor, louco para escapar dele.
Havia até quem, no princípio, admirasse o sujeito xarope, confundindo sua “xaropice” com carisma e comunicabilidade (eta palavrinha difícil, própria de um verdadeiro xarope).
E pentelho? Pentelho antigamente era outra coisa. O chato (aquele bichinho) adorava se enroscar num pentelho. Hoje pentelho é o garoto metido, impertinente, aquele em quem a gente tem vontade de meter a mão.
Se os chatos das categorias citadas forem metidos a intelectual, cheios de etiquetas, podem utilizar frases rebuscadas, termos empolados, procurando dar mostras de sua sapiência. Alguns chegam até a salpicar o interlocutor de saliva.
Mas que ninguém se engane: na maioria das vezes, o verdadeiro chato nem lhe ouve, só interessa a opinião dele; no fundo, é um egoísta, um ególatra, que deseja de todos os modos impor sua presença.