MALES DO CORPO E DA ALMA...

Os fatos sabidos até o momento, sobre a morte do cartunista Glauco e do seu filho Raoni, ainda levantam muitas questões que clamam por respostas.

Sabe-se, no entanto, que em uma comunidade voltada para o bem, com cunho espiritualista e fortes raízes indígenas, aconteceu um duplo assassinato.

O responsável pela comunidade, Céu de Maria, foi morto a tiros, juntamente com o filho.

O apontado como matador evadiu-se do local, aventa-se que foi ajudado por um cúmplice, fatos não devidamente esclarecidos até o momento.

Existem indícios espaços, que a um tempo mostram possíveis motivações para o crime e noutro levantam hipóteses que venham a esclarecer o ocorrido.

O fato é: aconteceram duas mortes, no mesmo local e simultaneamente.

No conto de Lygia Fagundes Teles não esta definida a ocorrência do óbito da personagem, mas sim as circunstâncias e os fatos que possivelmente levaram-na a este destino.

No conto, sob o pretexto de um encontro, um último encontro, a personagem vai até o que se mostrou posteriormente ser um cemitério abandonado, encontrar-se às escondidas, com aquele que fora o seu namorado em um passado recente.

No decorrer da narrativa, vão se descortinando, detalhes da vida pretérita de ambos: seu antigo envolvimento amoroso, seus desejos e seus pensamentos.

O mote usado pelo ex namorado, no conto, para atrair a ex namorada foi, apresentar-lhe o mais lindo pôr-do-sol.

Na argumentação dele, existem falhas, informações que se conflitam, mas que a personagem feminina não identifica de imediato.

No caso do assassinato do Glauco e do filho, não foram apresentados ainda, todo o rol de fatos, todas as marcas de contexto que propiciem uma idéia mais clara e abrangente dos acontecimentos.

Em leitura da revista Veja, número 12, março de 2010, foi relatada a existência de distúrbios psicológicos no acusado, que neste momento é um réu confesso. Distúrbios estes, que deveriam ter sido levados em conta pelo Glauco, ainda mais por que em sua comunidade faz-se o uso de substância psicotrópica.

Assim, o primeiro grande paralelismo entre o fato e o conto, se encontra na não observação de detalhes, tanto nos comportamentos, quanto nas falas do personagem masculino do conto e do réu confesso.

Um segundo paralelismo é a procura do ser humano pelo que mais lhe traga um bem, ou uma sensação de bem estar, e uma posição de destaque perante as outras pessoas.

O bem estar esta caracterizado, no Céu de Maria, a comunidade de Glauco, pela procura de equilíbrio físico, psíquico e espiritual. O bem estar perante as pessoas, fatos, presente no conto, se apresenta de duas formas distintas:

Na personagem feminina é a vontade de se sobressair diante do ex namorado uma vez mais, vontade esta que esbarra em seus sentimentos mal resolvidos e inacabados.

No personagem masculino é a vontade de vingar-se, por ofensas sofridas, ainda que apresente em si traços de um amor ainda não acabado, mesmo após ter sido abandonado e trocado por outro.

Os enredos tanto do conto de Ligya, quanto o fato do assassinato do Glauco, apresentam pessoas em diferentes graus de relacionamento, de vontades e objetivos e os espaços em que ocorrem a ação são a um mesmo tempo diferentes e análogos; diferentes pois no conto a ação se passa em um cemitério abandonado, e a ação do caso do Glauco, em uma comunidade com muitas pessoas, vários elementos.

A analogia é de que ambos são espaços de retiro, espaços de solidão!

As conseqüências são possivelmente as mesmas, a morte da personagem no conto, e de Glauco e do filho na vida real.

Em ambos os casos, estamos diante de males da alma, que sujeitam o corpo, sob o peso de enigmas, de mistérios. A alma pode sofrer e causar danos, seja sob o efeito de psicotrópicos, quanto sob o efeito de sentimentos mal resolvidos e de vontades não satisfeitas.

A grande discussão no conto e no lamentável fato ocorrido é sobre a fragilidade da vida humana, e das suas buscas por felicidade.

E nestas buscas, a vontade esta sempre em litígio constante com o orgulho e a vaidade.

Elementos que estão presentes em maior ou menor grau na constituição da psique humana.

Edvaldo Rosa

www.sacpaixao.net

06/04/2010