Cinema, letras e pessoalidades I: Viagem à Lua (1902) – dá para ver no YouTube!!
Impressionante a obsessão de nós seres humanos pelo obscuro, o desconhecido. Neste filme que, salvo engano, é o primeiro do gênero ficção científica – claro algo foi feito antes do Spielberg e do Lucas – feito apenas sete anos depois da invenção dos irmãos Lumiére e quatro anos depois do voo real de Santos Dumont. Assim, salta aos olhos a sedução e a longevidade do tema da viagem ao espaço e da colonização da Lua. Detalhe: o roteiro fora escrito pelo obsedado J. Verne!
Certeza e crença na capacidade humana não faltava a época: ferrovias, telefone, os “micróbios” e vacinas de Pasteur e Koch, a dominação – à ferro e à fogo – da África e da Ásia com o imperialismo, deveria garantir aos europeus muta segurança e fé na ciência
Nesse contexto é que se desenrola a trama de curtos oito minutos da ainda engatinhando sétima arte. Chama atenção a frequente e irritante “trilha sonora” tocada, ao que parece, ao vivo por um piano ao lado da tela de projeção e a ausência de um roteiro independente das cenas, que na medida exata em que ocorria era simultânea e pateticamente narrada, até nos detalhes mais banais como um personagem que caída num balde de água ao construir o “foguete espacial”. Nem essa algo ridículo cena pastelão “autoexplicativa” deixaria de ser literalmente verbalizada pelo narrador!
Quanto os sofisticados e destemidos “homens de ciência” aterrizaram na Lua, vemos alguns elementos que se tornaram quase arquetípicos nesse tipo de película: uma topografia diferente e fantástica (cogumelo gigantes, montanhas...); vidas extraterrestres – que possuíam formas e tamanhos mais ou menos como os nossos (como os “marcianos” dos filmes mais atuais); a luta travada entre os dois mundos … com vitória dos humanos, naturalmente...
Mesmo que o Armstrong décadas depois do filme e num novo contexto de disputa hegemônica – agora na conta da Guerra-Fria – tenha desbravado e desmistificado a Lua, esse clássico do cinema que nos causa tantos estranhamentos do ponto de vista de sua estética e linguagem, ainda nos diz muito sobre os anseios de conquista das “nações civilizadas”, seja contra “marcianos” ou “lunáticos”; “amarelos” e “negros”; “comunistas” e “terroristas”, ou qualquer outro inimigo inventado ou real.