Enfim, na TV

Enfim, na TV.

Aquele rosto no televisor pareceu-me conhecido. Aproximei-me. Sim, era ele. Como era mesmo seu nome? Luís Augusto..., não; José Augusto..., isso mesmo, José Augusto. Estava sorridente. Acenou para a câmara como se estivesse no auditório de um programa de variedades. Fez, ainda, um sinal de positivo com o polegar. Parecia deter o controle absoluto da situação. Parei diante do televisor para tentar entender o que estava acontecendo, qual o motivo de seu aparecimento na mídia.

Recordei-me de nosso último encontro. Andava ele pelas ruas da cidade, em companhia de um amigo, vociferando palavrões. Ao me ver, deteve-se, abriu um sorriso largo e veio ao meu encontro.

— É, professor, continuo a dar trabalho – disse-me ele, referindo-se ao tempo em que estudava na escola onde eu exercia o cargo de diretor.

Retorqui dizendo que aquelas atitudes de então eram próprias de crianças que estavam, naquele momento, atravessando maus momentos. Após breve colóquio onde lhe alvitrei paciência, respeito, busca de uma profissão, e de nos abraçarmos, despedimo-nos e seguimos nossos caminhos.

Postado diante do televisor, aguardando o restante da entrevista e comentários do repórter, lembrei-me novamente das imagens daquela criança que corria pelos corredores da escola, fugia das aulas, não fazia as tarefas, brigava com colegas, às vezes ensandecido, xingando, chorando, “dando trabalho” aos professores e inspetores de alunos, e que, como um ciclone a lançar projéteis para todos os lados atravessou minha mente. Depreendi, num relance, o motivo de suas atitudes àquela época. Os gritos que se lhe saíam dos pulmões não eram de agressão aos que ali trabalhavam, e, sim, de um pedido latente de socorro, de ajuda, que não foi entendido naquela ocasião e naquele instante, também inferi o motivo de seu sorriso na apresentação televisiva. Num programa policial! Acusado de homicídio!

São Joaquim da Barra, 20/07/05.

Gilberto Gabelini

No dia 16/01/07, o júri popular condenou José Augusto a 7 anos de prisão pelo homicídio simples ocorrido 19/07/2005.