SEU NOME SE MISTURAVA AO DA GAZETA...
Tivemos poucos momentos de amizade presencial. Porém, as poucas vezes que desfrutamos da companhia um do outro, a conversa fluía por várias horas. Era preciso um chamar a atenção do outro para o adiantado das horas.
Lembro-me, perfeitamente, da primeira vez em que fomos apresentados. Uma terça-feira pela manhã, na redação da Gazeta do Oeste. O jornalista Mário Gérson nos apresentou. Eu, começando a conhecer o que era uma redação de jornal; ele, com seus longos e experientes anos de convivência com o cheiro forte da notícia. E não era somente o cheiro que vinha de uma redação, não. Ele trazia, impregnado, o cheiro forte da notícia: da sua origem (nas ruas) até o seu estado final (redação), transformada em matéria (nas máquinas que imprimem o jornal).
Sim. Ele tinha em seu currículo profissional, uma extensa folha de serviços prestados a uma empresa, servindo de exemplo para os mais jovens e, principalmente, mostrando para as futuras gerações o que era vínculo, compromisso e fidelidade ao ofício que escolhera. Bem, no caso dele, ainda havia um adendo: ele trazia no currículo os vários degraus galgados, como se fosse uma receita de como progredir na vida profissional trabalhando com dedicação, aprendendo e aprimorando sua técnica.
Isso como profissional. Como “bon vivant”, sabia-se da maestria na arte de encantar com as cordas de um violão. Era um exímio violinista e, quando cantava, as cordas do seu violão cantavam junto, no mesmo tom, sem haver dissonância alguma. Não deixou de ser um profissional, também, na arte musical. Entretanto, esse dom não lhe trazia nenhuma soberba, pelo contrário. Era humilde no seu dizer e, sempre que podia, elogiava a quem merecia, apesar de saber que a sua virtuosidade com o instrumento musical equivalia à de quem ele dava o devido valor.
Uma vez nós estávamos no lançamento de um livro do jornalista Mário Gérson e, lá, vários músicos se revezavam na “palhinha” voz e violão. Eu estava ao lado dele. Nós dois observando a destreza de cada um deles. Todos muito bons. De repente, ele olhou para mim e disse: "E Mário queria que eu desse uma canja no evento... Sou lá doido! Só tem fera!" Eu olhei para ele e aplaudi internamente a sua humildade e companheirismo. No fim, ele foi “intimado” a fazer o encerramento. Quem estava no recinto percebeu a diferença melódica e o silêncio se fez presente para ouvir a sua voz acompanhada de uma suave dedilhada nas cordas do violão.
Ele também tinha um humor incrível, além de uma memória de elefante. Contava os causos sem deixar a dever aos principais contadores do gênero. Era também espirituoso e não perdia uma oportunidade de animar o ambiente, mesmo que ele fosse solene, como foi o caso, no casamento do jornalista Mário Gérson. O pastor, na hora da benção – quando os dois estavam de joelhos professando a sua fé naquela união – pediu para que o noivo ficasse de pé e levantasse a sua futura esposa. Ele não se aguentou e comentou, baixinho, com o seu colega da cadeira vizinha (o apresentador do programa Pedagogia da Gestão), João Maria: "Agora danou-se, João! Como é que Mário vai conseguir levantar a mulher se ele pesa a metade do peso dela?"
Era, no entanto, um gentleman. Certa feita, eu ia passando pelos corredores da Gazeta e dei de cara com ele. Parei e ficamos conversando. Ele, como sempre, elogiou a minha crônica do domingo e fez referência ao assunto colocado. Nisso, chega, vindo da portaria, a colunista social Ivonete de Paula. Com a elegância de uma “lady”, ela nos cumprimentou. De repente, ela olhou para mim e pareceu me conhecer. Eu, no entanto, me adiantei e me apresentei dizendo que a tinha visto cantar no rádio mossoroense, nos áureos tempos dos festivais e que, na época, ela cantava muito bem. Ela me agradeceu, porém ele, educadamente, me corrigiu: "Cantava não, Raimundo. Ela canta muito bem."
Nos últimos anos de sua vida, como se fosse mais uma marca a ser deixada para a eternidade, ele, convidado pelo jornalista Mário Gérson, passou a escrever sobre os valores musicais da terra de Santa Luzia. Resgatou todos aqueles que foram sucesso, num passado recente, os que são sucesso e os que a mídia não dava destaque, mas que eram referências musicais nas noites boêmias da nossa cidade. Conversando com ele, quando o assunto se voltava para os seus artigos, seus olhos brilhavam de alegria. Era como se ele tivesse fazendo nascer o seu filho mais novo. E era. Por várias vezes eu lhe pedi que transformasse tudo num livro. E logo. Ele, no entanto, me dizia: "Calma, está tudo diagramado. Na hora que for para ser publicado, não terá trabalho nenhum." Concordo com ele.
Porém, ele não pôde ver o seu último filho nascer. Antes, alguém lá por cima mandou chamá-lo. Foi, agora, dia 17 - faz pouco tempo. Ele, como era um bom cristão e, sobretudo, temente a Deus, foi. Fico a imaginar a festa que foi feita para a sua chegada! Também, lá por cima, hoje em dia, só tem a nata da boêmia!
Ah! Esqueci de dizer o seu nome. Mas, sabe de uma coisa? Não será preciso. Todo mundo sabe de quem estou falando...
Nota do Autor: José Ferreira Filho, o Ferreira da Gazeta.
Tivemos poucos momentos de amizade presencial. Porém, as poucas vezes que desfrutamos da companhia um do outro, a conversa fluía por várias horas. Era preciso um chamar a atenção do outro para o adiantado das horas.
Lembro-me, perfeitamente, da primeira vez em que fomos apresentados. Uma terça-feira pela manhã, na redação da Gazeta do Oeste. O jornalista Mário Gérson nos apresentou. Eu, começando a conhecer o que era uma redação de jornal; ele, com seus longos e experientes anos de convivência com o cheiro forte da notícia. E não era somente o cheiro que vinha de uma redação, não. Ele trazia, impregnado, o cheiro forte da notícia: da sua origem (nas ruas) até o seu estado final (redação), transformada em matéria (nas máquinas que imprimem o jornal).
Sim. Ele tinha em seu currículo profissional, uma extensa folha de serviços prestados a uma empresa, servindo de exemplo para os mais jovens e, principalmente, mostrando para as futuras gerações o que era vínculo, compromisso e fidelidade ao ofício que escolhera. Bem, no caso dele, ainda havia um adendo: ele trazia no currículo os vários degraus galgados, como se fosse uma receita de como progredir na vida profissional trabalhando com dedicação, aprendendo e aprimorando sua técnica.
Isso como profissional. Como “bon vivant”, sabia-se da maestria na arte de encantar com as cordas de um violão. Era um exímio violinista e, quando cantava, as cordas do seu violão cantavam junto, no mesmo tom, sem haver dissonância alguma. Não deixou de ser um profissional, também, na arte musical. Entretanto, esse dom não lhe trazia nenhuma soberba, pelo contrário. Era humilde no seu dizer e, sempre que podia, elogiava a quem merecia, apesar de saber que a sua virtuosidade com o instrumento musical equivalia à de quem ele dava o devido valor.
Uma vez nós estávamos no lançamento de um livro do jornalista Mário Gérson e, lá, vários músicos se revezavam na “palhinha” voz e violão. Eu estava ao lado dele. Nós dois observando a destreza de cada um deles. Todos muito bons. De repente, ele olhou para mim e disse: "E Mário queria que eu desse uma canja no evento... Sou lá doido! Só tem fera!" Eu olhei para ele e aplaudi internamente a sua humildade e companheirismo. No fim, ele foi “intimado” a fazer o encerramento. Quem estava no recinto percebeu a diferença melódica e o silêncio se fez presente para ouvir a sua voz acompanhada de uma suave dedilhada nas cordas do violão.
Ele também tinha um humor incrível, além de uma memória de elefante. Contava os causos sem deixar a dever aos principais contadores do gênero. Era também espirituoso e não perdia uma oportunidade de animar o ambiente, mesmo que ele fosse solene, como foi o caso, no casamento do jornalista Mário Gérson. O pastor, na hora da benção – quando os dois estavam de joelhos professando a sua fé naquela união – pediu para que o noivo ficasse de pé e levantasse a sua futura esposa. Ele não se aguentou e comentou, baixinho, com o seu colega da cadeira vizinha (o apresentador do programa Pedagogia da Gestão), João Maria: "Agora danou-se, João! Como é que Mário vai conseguir levantar a mulher se ele pesa a metade do peso dela?"
Era, no entanto, um gentleman. Certa feita, eu ia passando pelos corredores da Gazeta e dei de cara com ele. Parei e ficamos conversando. Ele, como sempre, elogiou a minha crônica do domingo e fez referência ao assunto colocado. Nisso, chega, vindo da portaria, a colunista social Ivonete de Paula. Com a elegância de uma “lady”, ela nos cumprimentou. De repente, ela olhou para mim e pareceu me conhecer. Eu, no entanto, me adiantei e me apresentei dizendo que a tinha visto cantar no rádio mossoroense, nos áureos tempos dos festivais e que, na época, ela cantava muito bem. Ela me agradeceu, porém ele, educadamente, me corrigiu: "Cantava não, Raimundo. Ela canta muito bem."
Nos últimos anos de sua vida, como se fosse mais uma marca a ser deixada para a eternidade, ele, convidado pelo jornalista Mário Gérson, passou a escrever sobre os valores musicais da terra de Santa Luzia. Resgatou todos aqueles que foram sucesso, num passado recente, os que são sucesso e os que a mídia não dava destaque, mas que eram referências musicais nas noites boêmias da nossa cidade. Conversando com ele, quando o assunto se voltava para os seus artigos, seus olhos brilhavam de alegria. Era como se ele tivesse fazendo nascer o seu filho mais novo. E era. Por várias vezes eu lhe pedi que transformasse tudo num livro. E logo. Ele, no entanto, me dizia: "Calma, está tudo diagramado. Na hora que for para ser publicado, não terá trabalho nenhum." Concordo com ele.
Porém, ele não pôde ver o seu último filho nascer. Antes, alguém lá por cima mandou chamá-lo. Foi, agora, dia 17 - faz pouco tempo. Ele, como era um bom cristão e, sobretudo, temente a Deus, foi. Fico a imaginar a festa que foi feita para a sua chegada! Também, lá por cima, hoje em dia, só tem a nata da boêmia!
Ah! Esqueci de dizer o seu nome. Mas, sabe de uma coisa? Não será preciso. Todo mundo sabe de quem estou falando...
Nota do Autor: José Ferreira Filho, o Ferreira da Gazeta.