A substituta
Vida de substituta na educação
Uma professora de biologia, concursada do município de São Paulo, trabalhando em uma EMEF na situação de módulo, se preferir, como professora substituta, posição conquistada através de concurso público e escolha de vaga não existente, porém, anunciada; ao receber a notícia que não assumiria aulas por falta de vagas na escola que escolheu, ficou chocada, decepcionada e principalmente perdida. Pensou: “e agora o que faço?” “Devo procurar outra escola?” Foi quando lhe avisaram que ficaria no módulo. Resolveu então procurar saber qual seria a função do professor módulo. Ao se informar na própria escola, acabou muito mais preocupada, pois ficou sabendo que seria professora substituta. Desesperou-se: “Meu Deus! Que horror! Após tantos anos de faculdade, quase vinte anos de experiência no magistério, virei professora substituta”. Não que a coitada tivesse algo contra os profissionais de apoio, ou seja, os profissionais que cobrem férias, folgas, faltas, licenças, etc. Aliás, toda empresa organizada conta com seu grupo de apoio. Mas, naquele momento a notícia chocou. Começou logo a se imaginar entrando a cada dia em uma sala diferente ministrando aulas de português, geografia, inglês, matemática... E os alunos mandando embora, pois se tem uma coisa que aluno detesta, é professor substituto, não sem razão, claro, afinal se o substituto não estivesse ali, seria mais uma aula livre. Bom, no meio de tamanho desespero, o único final de dia que conseguia enxergar para seus próximos dias como professora substituta era o
mesmo de uma pessoa que no lugar de livros, teria que carregar fardos de areia para construir o conhecimento.
Não tinha escolha, o ano letivo corria e tinha que assumir os encargos do cargo. Nos primeiros dias começou até a fugir, sentia-se insegura, com medo de enfrentar os alunos, torcia para que seus colegas não faltassem. Que martírio! Olhando para seus pares, a situação não era diferente. A professora de língua portuguesa, de repente virava professora de educação física, professor de geografia, virava professor de matemática, professor de inglês, virava professor de ciências, e assim seguia com as demais disciplinas. O caos estava instalado na educação.
Mas os problemas não esbarravam somente no jogo de cintura com as licenciaturas, tinha ainda aqueles momentos de total desqualificação e desrespeito por parte de outros colegas formados e concursados igualmente a ela. Situações como: “você viu algum professor por aqui?” (nesse caso, “algum professor”, seria um professor com aula atribuída). Outro: “Haverá concurso para ocupar vaga de subemprego, tratem de cuidar de sua vaga pode perder para outro mais esperto.” (aqui se referindo a vagas para professor do tão falado módulo).
Bom, no meio de tantos entraves para exercer o seu cargo, a professora decidiu tomar a iniciativa de desenvolver um projeto que fosse ao encontro e ao interesse dos alunos e a solução do seu problema. Apresentou o projeto para a coordenação, claro, baseado na sua formação. A partir da sua aprovação, mudou a forma de se apresentar na sala de aula para os alunos, quando perguntavam se era a professora substituta, respondia firmemente: “não, sou professora de biologia e darei aulas de educação sexual”. Com o passar dos dias deixou de ser a “professora substituta” e passou a “professora de sexo”. A situação só não ficou pior porque antes de implantar o projeto de educação sexual, foi conversado com os pais sobre as aulas para que os mesmos aprovassem a idéia. Hoje a professora substituta é conhecida na escola pelos alunos como “professora de sexologia”. A esta altura, a nomenclatura já não tem tanta importância para ela, o que importa é alcançar seu objetivo, despertar o interesse dos alunos quando eles não a veem como sua professora.
Depois de vê seu problema parcialmente resolvido, descobriu através de uma reportagem publicada em uma revista de educação que fazia parte de um grupo de profissionais reservas, prontos para substituírem seus colegas que sofrem da síndrome: “Não suporto mais alunos”, mal desenvolvido por culpa de políticas mal elaboradas e verbas mal aplicadas. Ao confirmar o seu sucesso com os alunos a professora pode comprovar que não tem só uma profissão, tem uma missão. A missão de manter a escola pública funcionando, seja com substituto, com reservas ou subempregados. Hoje ela está muito feliz porque conseguiu comprovar para se mesma que a grande diferença entre os professores reservas e aqueles que criam projetos políticos de educação sentados em um banco de gabinete, é que os reservas do banco das escolas são bem formados, o que lhes falta são bons técnicos.