MINHA INFÂNCIA EM RUY BARBOSA
Pensando bem, ainda não fiz a minha maior travessura, e cada vez mais se torna difícil fazê-la, pois eu cresci. Embora com alguns desejos e atitudes de criança, minha infância passou e é recordação. Resta-me a criança interior, da qual não me perco, e as lembranças gostosas do que vivi na minha cidade, no interior da Bahia, no Piemonte da Chapada Diamantina.
Fui uma criança brincalhona e traquina. Experimentei de tudo, ou de quase tudo de bom da infância.
Joguei futebol e fui, até, boa goleira; no ataque não sabia qual era o meu time nem para quem passar a bola; com os “bicudos” (chutes fortes) coloquei muitas bolas nos telhados das casas.
Com meninos e meninas, pulei corda, joguei castanha (de caju), triângulo e bolas de gude(não aprendi a segurá-las na posição correta).
Fiz quitutes (comida feita em pequeninas panelas de barro), festejei aniversários e batizados das minhas bonecas.
Participei de várias dramatizações em palcos armados nas casas de amigos da nossa Rua São José, e, até, no salão do Centro Espírita do Sr. Aurino Costa.
No Grupo Escolar Carneiro Ribeiro, sob a direção da Professora D. Enoe Sacramento, além da excelente formação educacional ministrada por competentes e respeitadas professoras, brinquei muito de esconde-esconde, chicote-queimado e baleado (era difícil me balear). Antipatizava as filas de entrada para a sala de aula, mas aprendi os Hinos Brasileiros que eram cantados nessa hora.
Ainda não entendia muito, mas já vestia fantasia e admirava as festas de Momo, levada por meus pais. Crescida, era frequentadora dos bailes infantis no nosso Clube Social, sempre acompanhada da família. Em uma Micareta, um grupo de garotos amigos me prendeu duas vezes na roda que brincavam no salão; na primeira vez foi difícil me libertar; na segunda, fiz uma pequena travessura: joguei lança-perfume (permitido usar, na época)nos olhos do líder e fugi... não me aprisionaram mais.
Nas festas de São João, sempre havia uma fogueira armada que saltávamos – quando já era quase um braseiro – segurando nas mãos de alguém que se tornava nosso compadre ou comadre “de fogueira”. Sempre soltava muitos fogos (trazidos por meu pai) e gostava muito da canjica, do arroz-doce, do bolo de milho e dos licores feitos por minha mãe. Prefiro, até hoje, os fogos luminosos de efeitos especiais como as pistolas de tiros coloridos, as chuvinhas prateadas, os foguetes de lágrimas, as “cobrinhas” ao invés dos “canhões” de muitos tiros e das bombas de diversos tamanhos e estrondos maiores ainda.
O Natal, ainda hoje, é uma festa que considero linda e especial. Além da frequentadíssima “Missa do Galo” – obrigação sagrada para louvar o nascimento de Jesus – e da Ceia farta (onde não faltava o peru recheado, champagne e queijo do reino Palmyra), também amava os lindos arranjos típicos da época e as músicas, visitar os diversos presépios da cidade – especialmente o do Sr. Jacó (sempre um trabalho de arte com engenhosidades elétricas que ele criava). Quantos presentes eu recebi e quantos amigos compartilhavam conosco a alegria dessa celebração!
Frequentadora assídua do Cinema Santo Antonio, e depois do Cine Lux, na nossa cidade, torcia pelos mocinhos dos filmes de cowboys e por Tarzan (o herói das matas, o rei do cipó); assoviava, gritava e batia nas cadeiras, ou curtia o suspense de alguns filmes de terror, mas gostava muito das séries de Tom & Jerry e dos Filmes de Walt Disney.
Nos dias comuns, enquanto nossos pais conversavam, brincávamos à vontade. Algumas vezes assustei meus amigos com uma brincadeira: mostrava-lhes, “inocentemente”, o meu quarto onde eu arrumara a cama com grandes bonecos feitos com cobertores envoltos por lençol e uma vela acesa ao lado. Quantos gritos de pavor! Claro que havia a pronta intervenção da minha mãe para acabar a travessura.
Que aventura deliciosa subir a Serra do Orobó em grupo de amigos, sob a supervisão da minha mãe, brincando e sorrindo em busca de novidades! Atravessávamos os riachos que ali nascem e a mata coberta pela neblina, escorregando nas pedrinhas do caminho até chegar ao cume e divisar uma paisagem de sonho como recompensa. Outro desafio divertido era a descida sem escorregar nas pedrinhas soltas e rolar pelo terreno íngreme, especialmente onde havia lajedos que soavam com as pisadas.
Enfim, tive uma infância feliz e tranquila com meus pais, minha irmã, meus parentes e meus amigos junto a mim. Brinquei, estudei, passeei e viajei muito. Talvez outras crianças não tenham recebido da vida todas as oportunidades que tive, mas nem por isso viveram uma infância menos feliz e também repleta de recordações interessantes para contar.
Fazer travessuras, ser irrequieto e arteiro são algumas características de crianças saudáveis e felizes.
Dalva da Trindade S Oliveira
{Dalva Trindade}
25.08.2010
Número do Registro de Direito Autoral:131530994220795700