Adeus ao palco
Vícios vêem a tona... E percebo que meu personagem não combina com a minha persona. O texto que repeti a vida toda, não sai mais tão natural dos meus lábios. Virei uma atriz caricata, canastrona.
Mudei de forma tão lenta que não percebi que mudava. E caio em ciladas que eu mesma armo para mim – por medo, covardia ou tudo junto. Agora assumo, tenho um medo infindo dele. Tenho medo do que sinto por ele, tenho medo dele estar longe... Tenho medo de ser fogo de palha, mais uma fantasia para entrar no meu livro de memórias.
Então, tento como a péssima atriz que me tornei atuar: grito que não ligo, que não sinto, que sou forte. Eu toda poderosa, dona de meus desejos, uso a minha arrogância da forma mais latente e minto, principalmente pra mim, que naquele palco, sou feliz.
E a platéia acostumada com a minha má atuação, finge que acredita, bate palmas, aceita e esquece que dentro daquela pose toda tem apenas mais uma mulher apaixonada, perdida, carente. Esperando apenas um sinal para mudar toda sua vida, para viver ridiculamente seu conto de fadas. Eu até mudaria meu nome, Alice, conduziria muito melhor, esta minha nova fase, a do nervoso, a da abertura, a sem escudos.
Mas eu como toda canastrona, demoro por demais para sair do pior personagem que já atuei, do que criei para me proteger, do que me tornou durante muito tempo, onipotente e sozinha. As barreiras que eu mesmo criei hoje acabaram entranhadas em medo.
Sim, pela primeira vez assumo, morro de medo dele... Morro de medo do que sinto e do que seria capaz de fazer por ele... Então, me olho no espelho, e a vejo, meu proprio personagem rindo muito debochado, da angustia que hoje me acerca. Eu que tive todos que quis, eu que tenho o dom de envolver, eu que hoje, fico encarando um triste monitor, esperando ele piscar. Eu que já fui rainha, hoje sou quase serva... Já que no momento que ele ordenar, faço a mala e corro, o mais rápido que conseguir, para os braços que me fazem tão bem. Que me aninham e me fizeram feliz, como nunca fui.
Então, adeus, meu lado cínico. Adeus minha personagem, adeus minhas defesas, eu vou viver, de cara limpa. Apaixonada, louca, imprudente e feliz.