Mathilde – a mulher misteriosa

Mathilde, quem és tu? O tempo passa e não há maneira de desvendar o mistério por detrás de ti, sei que aparentas ser uma menina com os seus vinte e poucos anos, de pele morena, teimosa, orgulhosa, de sentido feminista tão forte, que só Virginia Woolf poderia fazer melhor; essa que o tempo levou de forma premeditada acaba por deixar suas entranhas bem enraizadas numa geração de mulheres que viriam a se emancipar já nos meados do século XX. A escritora brasileira Clarice Lispector é um exemplo disso, há quem afirme que ela seja quase que uma cópia de Woolf, eu não quero ir tão longe, pouco conheço da escrita desta senhora, pensava até, na minha ignorância que ela ainda era viva... Não se riam... pois para alguns de nós, europeus, ela é uma completa desconhecida; e como tal é prematuro da minha parte fazer qualquer comentário a respeito de...; no entanto, irei pelo diapasão de que muitas mulheres feministas de hoje se identificam com Woolf. Não sei se isso deve ser visto como um regozijo para a mulher moderna se um presente meio que envenenado. O poder que emana de mulheres feministas pode ter um quê a ele inerente, o que elas buscam já não é a igualdade de direitos, antes, a superação ao homem, e como tal, isso trará uma nova quezília entre os sexos. E não falta muito para que a primeira fornada de machistas comece a reivindicar a sua inferioridade. A luta de classes e sexos sempre foi uma constante na história da humanidade, aguarda-se como é óbvio, com alguma expectativa, pelo desenrolar desta eterna guerra.

Já Mathilde, agora dobrada sobre o joelho direito, se encaminha como uma pluma para o seu habitat, qual habitat? Dela se espera muito, se sabe pouco, e é por isso que ela chamou minha atenção, todo aquele mistério que a rodeia me atraiu, me seduziu como uma deusa tentando enfeitiçar seu amado; a busca de respostas sobre esta mulher me levou num caminho “teatralizante” para tentar, ao menos, ver de que material ela era feita. Tentei, escavei, e a cada passo que dava parecia que a verdade estava cada vez mais congelada, ainda assim, eu continuava remando contra a maré que na hora me era adversa, emotivamente eu procurava abrir uma brecha neste enorme castelo de cartas, eu sabia que bastava tirar uma das cartas do baralho para que toda aquela enquête se desmoronasse. Mas que carta tirar? O Ás de paus? A Dama? Qual? Ele parecia tão denso, forte, uma verdadeira muralha de granito enfeitada de beleza humana.

- Ah, como tudo aquilo mexia comigo, a azia revigorava no meu estomago, os soluços surgiam de leve, minha cara empalidecia a cada avanço, sentia-me cada vez mais curioso, mais intenso na procura de respostas, não é possível que uma mulher seja tão fechada, que tenha medo de abrir a boca como temendo que isso a colocasse em perigo, que todo o seu ser fosse revelado e, incompreensivelmente, amaldiçoado. Eu estava apaixonado pelo mistério que envolvia Mathilde, não o poderia nunca negar, embora temesse pelo dia em que tudo isso se dissipasse, quanto uma nuvem escura sobre o Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Do Teatro falarei outro dia, esse me tocou bem fundo, sua beleza interna era visível, eu ali estava em Banho-maria, coisa que não acontecia no colo de Mathilde. Seu colo era agreste, parecia esconder uma enorme manta de traumas, sofrimento, tristeza, enfim, nunca outrora um colo de uma mulher me pareceu tão frio – feitio dela? Talvez, mas algo mais pairava na minha cabeça sobre esta mulher que me consumia algumas horas da minha vida - eu agarrado ao meu sofrimento, exigia dela uma palavra de incentivo, como se lhe pedisse, por favor, para falar comigo. Ao que eu cheguei! Pedir tamanha coisa, mas ela, sim... Ela me levou á exaustão, e eu, não sei por que raio cismei com este labirinto, andava como um cordeiro a traz de um único rebanho, como fui tolo, ingênuo – fui arrogante ao tentar teatralizar a vida como se dessa forma eu pudesse obter respostas ou quem sabe me aproximar dela.

- Tudo em prol de um desafio que tinha metido na cabeça. Que desafio este caro leitor! Que teimosia tão absorta de princípios!!!

Não podia estar mais enganado, nada ia bem, eu o sabia desde o principio, porém, eu queria a certeza, a banana toda descascada, para depois, se ela me inspirasse eu pudesse tê-la para mim. Tudo acabou antes de começar, vivi intensamente tudo por antecipação, acho que acabo por ser uma pessoa que goza as coisas muitos antes de vivê-las: um bêbado que sente os efeitos do álcool antes do seu consumo, um mendigo que sofre na pele as intempéries antes mesmo de a primeira gota de água cair...; isso é culpa da impaciência que me invade na hora em que coloco meus pés no charco. Ela, não a impaciência, a Mathilde - nunca mais a vi, como se eu algum dia a tivesse visto! Nunca mais falei com ela, se é que eu verdadeiramente falei com ela! Deixei de ocupar os espaços que ela freqüentava – simplesmente terminou o que nunca começou. Desde o exórdio que o enigma me levou neste caminhar descalço, e nele, eu saí de mansinho, não querendo molhar mais meus pés nem discutir com ninguém, apenas abri a porta da saída, e disse - adeus - um adeus conformado, mas molhado.

Mathilde, Mathilde, não te guardo rancor nem ódio, a culpa é minha, por inteiro, fui eu que empurrei as coisas, que investiguei o que não deveria ser investigado. Que tentei tornar a paixão, maquinalmente, exigente. Jamais daria certo o que quer que fosse. Somos duas pessoas muito diferentes que passávamos horas discutindo como se água e azeite algum dia se juntassem. Inicialmente pensei que a discussão daria lugar à cordialidade, eu esperava por isso (sinceramente)... em vão diga-se de passagem. Neste momento de gestão dos fatos, só algo mais me apraz dizer: por que bater nesta tecla tanto tempo? Poderíamos ter evitado toda esta encenação artística, poderíamos ter dito basta, chega... Muito antes. Mas não, fui por aí adiante tal e qual uma locomotiva a motor de explosão... Evitando parar em cada estação que estava mais à mão – estava cego, eu o sentia, mas não o afirmava. Até que o combustível acabou, e eu acordei.

Depois disto me sinto um fantasma, talvez um Ghost Writer. Bem que Roman Polanski tem razão, nada é como deveria ser.

Jvcsilva
Enviado por Jvcsilva em 23/08/2010
Código do texto: T2455053
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