"Quem Avisa, Inimigo é" =Crônicurta=
Quando de meu primeiro casamento, terminado há mais de trinta anos, morei em uma rua bastante íngreme no bairro Aclimação, em São Paulo. Quase sem movimento e nenhuma fiscalização, todo mundo estacionava à vontade em qualquer lado e sem qualquer preocupação. Um dia cheguei em casa e, como sempre fazia, estacionei meu carro na contra-mão em frente à minha residência e abaixei-me para pegar alguma coisa no chão. Ao fazer isso senti uma pancada um tanto quanto forte no carro, levantei a cabeça assustado, e constatei que um Opala estacionara à minha frente e batera no meu ao dar marcha-a-ré.
O motorista puxou o carro para a frente, abriu a porta, desceu e nem ao menos olhou para o meu carro, para profunda irritação de minha parte. Interpelei-o enquanto desembarcávamos:
- Que negócio é esse, meu chapa? Bate no meu carro e nem ao menos pede desculpas?
Ao ver a grande diferença de tamanho entre nós dois, sendo eu bem menor que ele, o cara ficou valente:
- E daí, vai me cobrir de porrada?
- Não senhor, mas vou lhe dizer uma frase que vai te fazer sair correndo feito doido rua abaixo.
O cara riu alto e perguntou:
- Que frase mágica é essa? Vai me dizer que está armado? Se é isso, perdeu. Perdeu porque eu também estou.
- Nada disso, cara. A frase é “ Olha lá o seu carro descendo a rua sozinho”.
E estava mesmo. Ele havia puxado pouco o freio de mão, ou se esquecera de puxá-lo, e seu Opala novinho em folha ia ganhando velocidade rua abaixo enquanto ele tentava, desesperadamente, abrir a porta e entrar.
Não conseguiu. O belo veículo só parou quando encontrou um poste à sua frente e o abraçou com muito afeto.
Tive pena do valentão, mas por via das dúvidas entrei em meu carro, também Opala, mas não tão novo, e me mandei para que ele não soubesse que eu morava na casa em frente. Demorei foi a parar de rir.