Pergunta Íntima
Perguntei-te antes sobre a moralidade da morte na guerra.
A pergunta é aparentemente fácil de responder, não é?
Penso que te lembras daqueles filmes americanos do pós-guerra, quase todos a preto e branco, onde o bom da fita, o americano, claro, abre fogo sobre uma populaça e só mata os maus, os japoneses, claro, ou alemães, em último recurso ou orçamento. A metralha divina que poupa os justo e condena os maus. Uma maravilha da sociedade do século XX e XXI. Mas temos outras: -Os meninos em fila a caminho da escola no metropolitano de Tóquio, onde se vivia a criminalidade zero. Os jovens jugoslavos a praticarem desporto nas colinas magníficas do Kosovo. Os milhares de brasileiros sorridentes a desfilarem no sambódramo durante o regime militar. Os angolanos reunidos numa praça da cidade de Ondjiva a prometerem que “ao inimigo nem um palmo de terra!”. A promessa ancestral de paz na boca de um estudante filipino. Um refém francês a comer na mesma marmita do seu carcereiro nas florestas nocturnas da Colômbia. Um americano a gritar “Yes, We can” nas sepulturas omnipresentes de John e Robert Kennedy. Um sul-africano negro a receber um prémio Nobel que já não tinha força para levantar acima da sua cabeça.