Crônica do cotidiano carioca.
A viagem seguia tranqüila, apesar do calor e dos constantes engarrafamentos. É um dos dias mais quente do ano. Os termômetros, imponentes monumentos avistados a quase cada duas esquinas, em sua plural função anunciando os mais diversos produtos, beiram os 45 graus.
O ônibus seguia quase vazio. Dos quarenta e cinco bancos de seu interior, apenas oito pessoas ocupavam os primeiros da frente. Na parte traseira três adolescentes com cara de segunda feira, cadernos entre as pernas, cochilavam entre uma freada e outra. Inesperadamente um deles arregala os olhos, se levanta e, ato contínuo, puxa a cigarra, encosta no trocador e pede para saltar por trás. Está sem dinheiro para pagar a passagem. No pulso da mão esquerda, um relógio Water Ploof, enrolado a duas pulseiras de ouro. Sobre o peito um grosso cordão de ouro capaz de resistir o próprio corpo que a camisa aberta deixava transparecer. Usava calça Pierre Cardim e nos pés, lindo par de tênis All Star.