Até hoje, mesmo com tanta violência, toda capital tem esse privilégio. A criança cresce um pouco e escuta que lá na capital do estado ou do país tem mais chance de crescer. Lá, depois de dormir sozinha, comer um bife duro ou um ovo podre, ganhar uma cantada de um colega de quarto, começa a valorizar mais a vida. Então, como existe a estatística, todo ser humano que passou pelo menos dez anos numa capital de qualquer lugar é mais experiente e menos provinciano. Até hoje me pergunto quem nasceu primeiro: a capital do estado ou o capital do capitalismo. Andam juntos, angariados por políticos que tentam trazer do interior, através de falsas fantasias, pessoas que realmente tem alguma coisa para dar. É como se cada virgem que chega na capital fosse mais uma árvore plantada na nascente de seu rio cheio de lama. Chegam simplórios, humildes e com o decorrer do tempo se transformam em um deles. Outra falsa vantagem de um jovem se mudar para a capital é a liberdade, longe dos olhares sempre protecionistas dos pais e da sociedade do interior, que sempre tem menos o que fazer e se preocupa mais com a vida alheia.
De jovens viram pais, avós, tataravós e não conseguem retornar ao seu lugar de origem. Conheci muita gente que nem se lembrava do rosto da mãe. “Esmiudada, muito doente, talvez já tenha morrido.” Muito triste.
Escrevo isso porque vi uma reportagem dizendo que na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, um só ser humano tem no máximo, 4.7 metros quadrados para viver. Para quem é ruim em geometria é a mesma coisa que viver com os braços abertos e pronto. Se soprar muito forte estará invadindo o espaço do outrem.
Será que quantidade é melhor que qualidade? Sei que os políticos responderiam no quesito quantidade, mas eu, como ser humano? Responder o quê? Todo mundo é humano.
Meu “inimigo” da internet responderia que todo mundo procura seu próprio caminho. Sei não. Não nasci lá para dizer alguma coisa. Se tivesse nascido lá, se fosse um herói que conseguisse escrever alguma coisa, escreveria o quê? Meus dedos estariam dormentes.
JOSÉ EDUARDO ANTUNES