A Lógica nas Histórias de Criança

Nada mais interessante do que se infiltrar no meio das crianças e, sem ser percebido, escutar a sua lógica. Proporcionam-nos momentos riquíssimos quando, sentadas em círculo, escutam história, cuja interpretação se deduz através dos seus questionamentos. Nenhuma pergunta, por princípio, pode ser verdadeira ou falsa. Porém, feita por uma criança, a sentença interrogativa assume o valor de verdade que ela deseja. Assim, quebram o silêncio para questionar de vários modos sobre a mesma coisa ou do mesmo modo sobre várias coisas. A principal questão da meninada é se “a história é de verdade”. Se pensam os contadores de história que esta pergunta não é embaraçosa, enganam-se. Fico a duvidar o que seria verdade para elas. Nem menos saberia responder se o que foi narrado estaria acontecendo ou estaria ainda a acontecer. Pois, na maioria das vezes, percebe-se que a chamada história-ficção ou o conto se realiza, em pedaços, a cada momento.

A
cabeça da criança, independentemente da realidade, deseja que aconteça ou tenha acontecido a história que lhe agrada e que nunca seja “de verdade”, mas “de mentira” a que lhe desagrada. Quanto aos adultos, neste aspecto, cabe a distinção entre o desejável e o provável. A valorização da ficção multiplica a história em histórias, e muitas delas são contadas para que não aconteçam. Em certo sentido, Thomas Hobbes considera a ficção do “lobo mau de Chapeuzinho Vermelho” existente em cada homem: homo homini lupus (o homem é lobo para o homem), expressão originada na peça teatral Asinaria, de Plauto. Esta generalização atinge inclusive o Chapeuzinho Vermelho, sua avó e, especialmente, os caçadores desta fábula.

A segunda principal pergunta da criançada se destaca, antes do fim de cada história, sob o ponto de vista ético: “quem é do bem, quem é do mal?” Às vezes, sem algum preconceito, assim indagam até em relação ao “lobo mau”. Esqueço o mundo maniqueísta do bem e do mal, eventualmente, ensinado na escola ou na religião, para me referir ao “mundo mau” em que vivemos: violência de onde, racionalmente, se espera paz; crimes horrendos de onde, humanamente, se espera amor e muita desonestidade, que politicamente deveria ser conduta ética. No domingo passado, Dia dos Pais, a repórter perguntou a um transeunte na Lagoa se ele tinha filho, a que respondeu: “- Ontem, acabou de nascer o segundo”. E, em seguida, qual profissão desejaria que os filhos seguissem. Desprezando a escolha interesseira de alguma profissão promissora, deu sábia resposta, tal qual o desejo das crianças ao ouvir o contar de histórias: “ - Quero que eles sejam pessoas de bem”.