EUSEBIUS E FLORESTAN (Homenagem a Schumann)

Florestan e Eusebius marcam as biografias de Schumann como as personalidades contrastantes do grande representante do romantismo alemão que, segundo Carpeaux, foi consagrado como o poeta do piano. O compositor presenteou a humanidade com obras como Devaneios (Träumerei) nas Cenas Infantis Op. 15 (Kinderszenen) e o divino Concerto para piano em lá menor.

Criados pelo compositor como pseudônimos para assinar os artigos na Nova Revista de Música (Neue Zeitschrift für Musik) fundada por Schumann em 1834, Florestan e Eusebius eram os heterônimos do articulista e significavam as próprias faces do compositor. Personagens imaginários que encarnaram os aspectos de sua natureza ambígua e oscilaram entre suas crises de profunda depressão e seus períodos de intensa criatividade. O enérgico e o sonhador, o arrebatado e o reflexivo, o dionisíaco e o apolíneo...

Com o sentimento projetado num jogo de espelhos coloridos, sua música era a concepção fiel de sua personalidade, uma subjetividade que não se ajustava às formas definidas, um caleidoscópio de palavras, sons e idéias. Ora Florestan, ora Eusebius, porém nunca um ser morno, sem paixões ou reflexões, adaptado aos padrões da época.

O filho do livreiro, que viveu imerso na literatura durante a adolescência, poderia ser poeta ou advogado, como queria sua mãe, mas foi na composição musical que encontrou o tecido perfeito para cerzir definitivamente o som com a idéia. Schumann era um intelectual.

Robert Schumann protagonizou o mais belo idílio amoroso da história da música com a exímia pianista Clara Wieck Schumann, mas o amor não foi suficiente para fazê-lo esquecer da proximidade da loucura. O medo escrevia o seu desfecho.

Sofria perturbações psíquicas cada vez mais graves que culminaram nas alucinações em que ouvia harmonias que lhe chegavam do céu trazidas pelos anjos e percebia os demônios que o ameaçavam com o inferno. A razão e a impulsividade do homem, que sempre se inspirou em histórias imaginárias, cheias de duplos, tomavam rumos irreversíveis e o lançaram no rio Reno em 27 de fevereiro de 1854 numa desesperada tentativa de suicídio.

Privado dos sonhos e da clareza da realidade, Schumann desistiu de tentar vencer a loucura e pediu para ser internado num sanatório para doentes mentais em Endenich perto de Bonn. Distante dos seus, talvez a terceira personalidade pouco conhecida, Meister Raro, o moderador, que tantas vezes interveio como conciliador de Eusebius e Florestan, tenha tentado resgatar o gênio, mas a vesânia venceu e, dois anos após, em 29 de julho de 1856, o mundo se despedia do grande compositor romântico e de seus duplos.

Helena Sut
Enviado por Helena Sut em 18/09/2006
Reeditado em 27/09/2006
Código do texto: T243594