FEIRA DE DOMINGO  
 
Cheguei da Feira da Glória. Um trapo. Ir à feira engloba etapas:                           Primeira: resolver se vou ou não.
Segunda: indo é ótimo, concluo que valeu, fico mais inteligente e olho o mundo.
Terceira: fico compreensiva demais, filosofo, e subo os últimos degraus do meu prédio, pisando cada pé em cada degrau, já que em cada um com cuidados do limite do corpo e do equilíbrio.

Ontem foi dia de bordar o dia todo envolvido pelas linhas e cores, tal que nas quatro bordas do pano eu tinha que por todas as cores em tempo recorde e em dégradé.
Eu tenho muitas bobagens, entusiasmos. Nunca estou na mesma coisa.

Mas hoje vi o esplendor e fartura das frutas brasileiras. E a beleza das nossas! Já imaginou estas frutas nas boquinhas das crianças do Hamas (Ramás), os palestinos e os israelitas...
Olhar pra fora da gente é enriquecedor, mas pode ser devastador de nós mesmos.
E não são só as crianças na guerra, são também as crianças de famílias miseráveis pelas calçadas do Rio... Ai que suspirar fundo e continuar.  
  

E amar as pessoas.

Mas acho que “odeio” os egoístas e maus. Não posso ter um revolver nas mãos. Pois se ver um homem mau estuprando uma menina ou um menino, eu dou o tiro e o elimino da vida. Sei reconhecer que não posso ter comigo uma arma mortífera. É um elemento símbolo da destruição mesma. Leva ao ódio, à justiça ou ao perverso.

O que falo não é discurso, é consciência.

Eu só posso ter em mãos flores, alimento e compreensão.
Não é uma fuga ouvir o Chico, é uma necessidade do belo, da música, do poeta, o bem da nossa alma.

Nossos irmãos miseráveis tentando vender o seu lixo ou suas migalhas, suas preciosidades... Viaja o amor, a compreensão, a participação e o prazer de trocar mundos diferentes.
Um pobre homem, de idade imprecisa, uns quarenta anos, estava arrumando sua bancada de trastes, coisa bem desagradável na calçada, mas fazia movimentos harmoniosos, caprichosos soltando o seu belo na sua atitude, que me chamou a atenção. Há muita gente sem recursos de sobrevivência e desempregados, que um dia tiveram profissão, emprego. Quis dar alguma atenção a ele e indiquei uma bolsa de couro usada. Quanto, perguntei. Ele – “quatro”...   “Eu digo: acho que deixo pra outro dia...” Ele, mais que depressa – “deixo por três”... Ai! Compreendi, ser importante a peça ser vendida.            Eu, “segura minhas flores, deixa ver se tenho...”, mas achei só moedas de 1,75... E mostrei. –” Ele, ta bom, pode levar que dá para eu tomar um café...”
Levei a bolsa de 1,75... Como sangra o coração da gente... Indignação.

Como pode um dispor de cem e o outro de bilhões? Como pode a arma de Israel ser altamente sofisticada e a arma do Hamas ser artesanal e de pequeno alcance?
Como um menino de Israel vê um menino do Hamas? E vice-versa? Será que eles conseguem se verem como duas crianças inocentes, apenas dois meninos?
 
Fecho os olhos, reconsiderando que não tenho o direito de olhar a paz, com o leve balançar das árvores da beira da rua. Sento na minha varanda.
Credo, meu Deus, isto pode levar a um infarto. Baixo os olhos pra mais pertinho, para a simplicidade de mim, para uma jardineira em que nascem matinhos originados pelos passarinhos que voam aqui e freqüentam meu lugar. Pois a simplicidade e o respeito acolhedor da liberdade trazem bons frutos.

Uma planta delicada está crescendo e foi obra dos selinhos, ela cresce numa haste só, delicada, e dá folhas macias sempre em conjunto de três, dispostas regularmente e tendo a da extremidade um tamanho maior e, de vez em quando, da haste desenvolve um fino galhinho com uma ou duas florzinhas claras, entre o branco, o lilás suave e o verde leve, como se fosse um minilírio de cinco pétalas e, lá no fundo do cálice um amarelinho, talvez o pólen,                     
Oh Deus, oh Deus, cada vez Você ensina mais!

A delicadeza desse pequeno bioma dos passarinhos, a terrinha da jardineira e as plantinhas tão delicadas, tão doces, de uma mansidão de bem e belo... Que lição para nossas angustias! Que doce! Que paz.
            Consigo respirar bem de novo.
            Desejo o mesmo para todos neste dia de hoje,