Psicose maníaco-romântica
Já tentei, juro por todos os santos - dos quais em nenhum acredito - mas não consigo construir meus versinhos fora dos temas amor, mulher, paixão, erotismo etc. O caso é que, sendo portador de uma doença incurável chamada de "psicose maníaco-romântica", me é visceralmente impossível manter a minha obra poética totalmente desvinculada do lirismo amoroso.
Tal doença tem as suas raízes na minha genética e com o fato de ter lido, num dia qualquer dos meus 15 anos, o célebre poema lírico-amoroso do meu conterrâneo poeta Gonçaves Dias, intitulado "Ainda Uma Vez Adeus!"
Meu avô materno, Santiago, era lusitano da cidade do Porto, aventureiro, violeiro, poeta repentista, mulherengo e doido por uma pilhéria – e dele devem ter vindo os genes do lirismo e do coração generoso e romântico do português, do gosto por um rabo de saia, do humor e, provavelmente, da poesia romântica. E, em especial, os genes da luxúria e do humor devem ter sido reenviados para mim, já com maior intensidade, por meu pai e meus dois tios paternos, todos mulherengos e piadistas de plantão.
Esse foi o começo. Depois, aos 8 anos, no 2º ano primário, apaixonei-me pela professora - Dona Rosário, loirinha, de fulgurantes olhos verdes, linda, linda! E muito, mas muito inteligente... Estabeleceu-se aí o meu primeiro "Calcanhar de Aquiles": mulheres atraentes e inteligentes. Mais lá na frente, num dia qualquer dos meus 15 anos, li, numa antologia poética, um dos mais belos poemas lírico-amorosos da Literatura Brasileira - "Ainda Uma Vez Adeus!" do poeta maranhense Gonçalves Dias, totalmente dedicado ao seu frustrado caso de amor com a sua eterna musa, Ana Amélia, e cujas estrofes - inicial e final - são as seguintes:
PRIMEIRA ESTROFE:
"Enfim te vejo! - enfim posso,
Curvado a teus pés, dizer-te,
Que não cessei de querer-te,
Pesar de quanto sofri.
Muito penei! Cruas ânsias,
Dos teus olhos afastado,
Houveram-me acabrunhado
A não lembrar-me de ti! "
ÚLTIMA ESTROFE
"Lerás porém algum dia
Meus versos d'alma arrancados,
D'amargo pranto banhados,
Com sangue escritos; - e então
Confio que te comovas,
Que a minha dor te apiade
Que chores, não de saudade,
Nem de amor, - de compaixão. "
A história (verídica): Gonçalves Dias (1823-1864), célebre poeta romântico e indianista da 1ª fase do Romantismo Brasileiro, pediu Ana Amélia, moça da alta sociedade maranhense da época, em casamento, em 1852, mas a família dela, em virtude da ascendência mestiça do poeta, refutou veementemente o pedido. Apesar de Ana Amélia se mostrar disposta a enfrentar o preconceito da família e a fugir com ele, o orgulho ferido do poeta falou mais alto e ele foi embora para a Europa, recusando o sacrifício da moça. Casaram-se os dois com outras pessoas, mas ambos foram infelizes nos seus respectivos casamentos.
Foi em Lisboa, num jardim público, que certa vez se defrontaram o poeta e a sua amada, ambos abatidos pela dor e pela desilusão de suas vidas, ele cruelmente arrependido de não ter ousado tudo, de ter renunciado àquela que com uma só palavra sua se lhe entregaria para sempre. Desvairado pelo encontro, que lhe reabrira as feridas e agora de modo irreparável, compôs de um jato as estrofes de "Ainda uma vez Adeus!" as quais, uma vez conhecidas da sua inspiradora, foram por esta copiadas com o seu próprio sangue.
Agora me digam, meus caros leitores, minhas caras leitoras, além dos "Romeus" que habitam a minha shakespeariana mente, e a minha herança genética - onde predomina uma acentuada inclinação física e psíquica para as mulheres e para o romance - como vocês queriam que eu ficasse quando aos 15 anos soube dessa incrível história de amor e li, quase em êxtase, esse extraordinário e comovente poema de amor? Nada mais, nada menos que liricamente perturbado!
Sou, pois, desde esse tempo, um portador dessa moléstia incurável chamada "psicose maníaco-romântica". E não foi por outra razão que, ao concluir a Faculdade de Letras, optei por ensinar exclusivamente a disciplina Literatura Brasileira, e sempre para o Curso de Magistério, onde, pelo menos até eu me aposentar, em 2005, o sexo feminino era maioria absoluta no corpo discente.
E por se tratar de uma patologia de caráter irreversível, é certo que a minh'alma e minha poesia continuarão a viajar impunemente pelas líricas imensidões do meu Parnaso, defrontando-se aqui e acolá com as minhas inevitáveis musas. Algumas delas não saberão que as elegi minhas musas; outras não acreditarão nisso, sob a alegação de que o amor dos poetas é passageiro como uma nuvem nômade; por fim, outras me retribuirão muito, pouco ou nada. Mas isso faz parte, porque o caminho para o coração das musas - que são mulheres - é tão misterioso quanto cheio de escarpas.
Mas o que importa mesmo é que o poema - nas asas da fantasia, da ilusão, do sonho ou da esperança - voe sempre tão alto quanto o permita a inspiração do poeta.
Já tentei, juro por todos os santos - dos quais em nenhum acredito - mas não consigo construir meus versinhos fora dos temas amor, mulher, paixão, erotismo etc. O caso é que, sendo portador de uma doença incurável chamada de "psicose maníaco-romântica", me é visceralmente impossível manter a minha obra poética totalmente desvinculada do lirismo amoroso.
Tal doença tem as suas raízes na minha genética e com o fato de ter lido, num dia qualquer dos meus 15 anos, o célebre poema lírico-amoroso do meu conterrâneo poeta Gonçaves Dias, intitulado "Ainda Uma Vez Adeus!"
Meu avô materno, Santiago, era lusitano da cidade do Porto, aventureiro, violeiro, poeta repentista, mulherengo e doido por uma pilhéria – e dele devem ter vindo os genes do lirismo e do coração generoso e romântico do português, do gosto por um rabo de saia, do humor e, provavelmente, da poesia romântica. E, em especial, os genes da luxúria e do humor devem ter sido reenviados para mim, já com maior intensidade, por meu pai e meus dois tios paternos, todos mulherengos e piadistas de plantão.
Esse foi o começo. Depois, aos 8 anos, no 2º ano primário, apaixonei-me pela professora - Dona Rosário, loirinha, de fulgurantes olhos verdes, linda, linda! E muito, mas muito inteligente... Estabeleceu-se aí o meu primeiro "Calcanhar de Aquiles": mulheres atraentes e inteligentes. Mais lá na frente, num dia qualquer dos meus 15 anos, li, numa antologia poética, um dos mais belos poemas lírico-amorosos da Literatura Brasileira - "Ainda Uma Vez Adeus!" do poeta maranhense Gonçalves Dias, totalmente dedicado ao seu frustrado caso de amor com a sua eterna musa, Ana Amélia, e cujas estrofes - inicial e final - são as seguintes:
PRIMEIRA ESTROFE:
"Enfim te vejo! - enfim posso,
Curvado a teus pés, dizer-te,
Que não cessei de querer-te,
Pesar de quanto sofri.
Muito penei! Cruas ânsias,
Dos teus olhos afastado,
Houveram-me acabrunhado
A não lembrar-me de ti! "
ÚLTIMA ESTROFE
"Lerás porém algum dia
Meus versos d'alma arrancados,
D'amargo pranto banhados,
Com sangue escritos; - e então
Confio que te comovas,
Que a minha dor te apiade
Que chores, não de saudade,
Nem de amor, - de compaixão. "
A história (verídica): Gonçalves Dias (1823-1864), célebre poeta romântico e indianista da 1ª fase do Romantismo Brasileiro, pediu Ana Amélia, moça da alta sociedade maranhense da época, em casamento, em 1852, mas a família dela, em virtude da ascendência mestiça do poeta, refutou veementemente o pedido. Apesar de Ana Amélia se mostrar disposta a enfrentar o preconceito da família e a fugir com ele, o orgulho ferido do poeta falou mais alto e ele foi embora para a Europa, recusando o sacrifício da moça. Casaram-se os dois com outras pessoas, mas ambos foram infelizes nos seus respectivos casamentos.
Foi em Lisboa, num jardim público, que certa vez se defrontaram o poeta e a sua amada, ambos abatidos pela dor e pela desilusão de suas vidas, ele cruelmente arrependido de não ter ousado tudo, de ter renunciado àquela que com uma só palavra sua se lhe entregaria para sempre. Desvairado pelo encontro, que lhe reabrira as feridas e agora de modo irreparável, compôs de um jato as estrofes de "Ainda uma vez Adeus!" as quais, uma vez conhecidas da sua inspiradora, foram por esta copiadas com o seu próprio sangue.
Agora me digam, meus caros leitores, minhas caras leitoras, além dos "Romeus" que habitam a minha shakespeariana mente, e a minha herança genética - onde predomina uma acentuada inclinação física e psíquica para as mulheres e para o romance - como vocês queriam que eu ficasse quando aos 15 anos soube dessa incrível história de amor e li, quase em êxtase, esse extraordinário e comovente poema de amor? Nada mais, nada menos que liricamente perturbado!
Sou, pois, desde esse tempo, um portador dessa moléstia incurável chamada "psicose maníaco-romântica". E não foi por outra razão que, ao concluir a Faculdade de Letras, optei por ensinar exclusivamente a disciplina Literatura Brasileira, e sempre para o Curso de Magistério, onde, pelo menos até eu me aposentar, em 2005, o sexo feminino era maioria absoluta no corpo discente.
E por se tratar de uma patologia de caráter irreversível, é certo que a minh'alma e minha poesia continuarão a viajar impunemente pelas líricas imensidões do meu Parnaso, defrontando-se aqui e acolá com as minhas inevitáveis musas. Algumas delas não saberão que as elegi minhas musas; outras não acreditarão nisso, sob a alegação de que o amor dos poetas é passageiro como uma nuvem nômade; por fim, outras me retribuirão muito, pouco ou nada. Mas isso faz parte, porque o caminho para o coração das musas - que são mulheres - é tão misterioso quanto cheio de escarpas.
Mas o que importa mesmo é que o poema - nas asas da fantasia, da ilusão, do sonho ou da esperança - voe sempre tão alto quanto o permita a inspiração do poeta.