CONSPURCAÇÃO PELO ÁLCOOL

Não pretendo fazer aqui um tratado sobre os efeitos lastimáveis exercidos pelo álcool no indivíduo. Longe isso! Apenas relatar a verdade nua e crua, como presenciei com os meus próprios olhos.

Um fato corriqueiro, muito comum em nossos dias mas que, talvez pela violência com que se apresentou ante meus olhos de adolescente, me deu motivos para criticá-lo.

É sabido de todos que o álcool, mesmo em pequeno grau, é um veneno para a alma e para o corpo. Entretanto, bem poucas pessoas consideram essa tese; preferem aquela de que o álcool é o remédio, o bálsamo, o consolo para o esquecimento das misérias e tristezas da vida – segundo o nosso Jeca.

Isso pensam os pobres de espírito. O indivíduo bebendo, não raro procura na excitação causada pelo álcool aquilo que lhe é negado pela consciência quando em seu estado normal:- o extravasamento dos seus instintos animalescos, a demonstração pública das suas baixas qualidades, o seu lado ruim, afinal. A tendência é, geralmente, essa.

Por isso as estatísticas provam:- 90% dos criminosos, delinqüentes e infratores cometem seus crimes quando alcoolizados.

O álcool é um perigo, uma ameaça constante á boa índole, à boa formação moral de todo indivíduo. Quem não bebe nunca deveria beber. E quem bebe deveria parar.

A excitação causada pelo álcool no indivíduo é caracterizada por várias manifestações. Há os que se tornam violentos, agressivos, insopitáveis mesmo. Outros preferem aquietar-se, dormir um sono anormal provocado pela embriaguês. Outros ainda revoltam-se sem motivo contra tudo e contra todos, proferindo palavras de baixo calão, fazendo gestos obscenos, deixando-se envolver completamente pelas malhas da indecência.

È do tipo que se torna brutal, violento, a cena que procurarei descrever linhas abaixo. Esse, pobre coitado, sofre mais que os outros. Moral, espiritual e fisicamente. Moralmente porque é de todos conhecido o abalo experimentado pelo beberrão após os efeitos etílicos. Ele começa a recordar-se, a princípio vaga e tênue, para depois clara e minuciosamente, dos fatos em que se envolveu quando ébrio. E então sofre, pobre miserável! Sofre a vergonha do ridículo cometido. Medida sobre tudo aquilo e, ao invés de bater no peito e dizer “mea culpa, mea máxima culpa”, ele, como todos os escravos do vício, não encontra forças para abandonar o infeliz costume.

Espiritualmente porque todo ébrio é magoado pelo vício, que lhe corroi a alma, vincando-a de sulcos profundos, os quais se refletem na maneira de viver do viciado:- esquece-se de Deus, da família e da sociedade. Passa a viver como um animal, sem meditar, procurando apenas nas suas libações um bálsamo, um consolo imaginário e fictício para o seu atribulado espírito.

E fisicamente porque, isso é óbvio, todo bêbado se expõe ao risco da sua integridade física, quer se envolvendo em brigas, em arruaças, etc., quer se sujeitando a desastres, a incidentes desagradáveis, etc. . O pobre coitado, incentivado pelo falso poder que transmite o álcool, provoca, criando um ambiente de tensão insuportável para os que o rodeiam. Geralmente esgota-se a paciência dos circunstantes e o bêbado apanha a bom valer.

Quero, usando da realeza e da dureza impressionantes nas quais foi envolto, descrever um fato corriqueiro, como já disse linhas acima, mas que entristeceu profundamente quantos o presenciaram.

Três sujeitos, bêbados, era notório, entraram num bar da Renascença. Seriam aproximadamente vinte e três horas duma segunda-feira gélida. Os três vinham de um casamento nas proximidades, bem trajados mas visivelmente embriagados.

Retornava eu das aulas, com vários colegas e, ao passarmos defronte ao bar, fomos atraídos pela algazarra lá dentro. Aproximando-nos, confirmamos as nossas suspeitas:- borrachos!

Por mera curiosidade, talvez, permanecemos por ali, aguardando o final da comédia. Os três pinguços, desconhecidos no bairro, provocavam a turma de rapazolas freqüentadores do estabelecimento.

Foi quando, na hora de pagar a conta que já ia alta, houve um desentendimento entre eles:- um queria pagar, outro não deixava, etc. .

Conversa vai, conversa vem, surgiu uma troca de empurrões. O baixinho deles deu uma capoeira muito mal aplicada no seu companheiro que, mais tonto do que pròpriamente atingido, rodopiou nos calcanhares, desequilibrou-se e caiu com estrondo na calçada. Ergueu-se com dificuldade, cambaleante e dirigiu-se ao seu amigo ofensor:-

“- Hei colega, você ... tá valendo, né?”

O outro não respondeu. Limitou-se a tirar o paletó amarrotado e, jogando-o para o terceiro, apreciando divertido a cena, foi de cabeça na barriga do adversário.

Mas o companheiro, muito desajeitadamente, tirou o corpo fora enquanto o seu oponente se esborrachava de encontro à parede do bar.

Levantou-se, meio bambo. O outro, com dificuldade, ergueu a perna e aplicou-lhe um pontapé no peito. Novo tombo do colega!

E ficaram naquela briga sem graça até que, cansados, sujos e arranhados, abraçaram-se e foram beber mais ainda.

A turma do bar olhava, ansiosa, esperando apenas uma oportunidade para cobrir o pau no trio. E ela não se fez esperar. Era o inevitável.

E eu, apavorado, vi ante meus olhos um homem, um ser humano, ser pisado, chutado e massacrado como se fosse um animal:- socos, pontapés, pescoções, etc. .

Seus dois amigos, os quais antes gritavam, provocantes, dizendo que ali não tinha homem, que viessem para a briga, etc., sumiram espavoridos. Deixaram o mais valente, pobre diabo, nas mãos dos rapazes sequiosos de espancamento. Amigos, essa é muito boa! Nosso melhor amigo é o bom senso.

E o que concluímos depois disso? Simplesmente o álcool, o grande culpado de tudo.

Antes, um rapaz vistoso, elegante, bem trajado. Com alguns goles de cachaça na testa, algumas provocações e se tornou em poucos instantes no indivíduo machucado, esfolado, sujo e esmolambado à minha frente, os olhos vermelhos e lacrimejantes, como se a pedir piedade.

Isso, amigos, vemos quase cotidianamente. Geralmente é o fim do espetáculo, o epílogo de uma noite de orgia, de farra e de bebedeira.

Portanto, jovens amigos, apelai para o vosso bom senso. Não vos deixeis nunca enredar pela trilha da perdição, da degradação e do vício.

Não vos deixeis iludir pela cognominada “juventude transviada” de nossos dias. Preservai vossos bons costumes, vossas boas maneiras e repeli as bravatas, a desordem e o álcool, esse flagelo da vida moderna! ...

-o-o-o-o-o-

B.Hte., 1958

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 09/08/2010
Código do texto: T2428113
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