Recaída
Se me perguntarem a que pé está meu novo começo de vida, só posso dizer que cheio de novidades. Primeiro porque quando se quer começar algo novo, a gente acaba enfiando os pés pelas mãos, é tudo lindo, empolgante e a gente sente vontade de abraçar o mundo. É, ainda estou na fase de empolgação. Isso é bom, de certa forma porque você se sente livre e age como se o mundo estivesse na palma de suas mãos. Vivendo como se não houvesse amanhã.
Mas algumas coisas me pegaram de surpresa nesse fim de semana, principalmente quanto ao meu amor que eu pensava estar curado.
Tenho aprendido que na vida a gente precisa levar as coisas com paciência, deixar rolar. A vida se encarrega de trazer as surpresas, mesmo que elas não aconteçam quando a gente mais precisa.
Quando estamos apaixonados, não agimos de verdade, não somos nós mesmos. Isso porque quando se está encantado com alguém, temos a péssima mania de querer impressionar. Me vi assim quando me apaixonei por um amigo. Eu o conheci quando fazia meu estágio. Não me lembro como as coisas foram caminhando até me ver apaixonada por ele e depois de vários acontecimentos difíceis, choros e sofrimentos, resolvi seguir minha vida.
Esquecer alguém por quem se alimentou sentimentos é torturante e eu acabei escolhendo a pior das maneiras, comecei a ignora-lo, quebrando minha promessa de que nada mudaria na nossa amizade. O que eu deveria fazer ainda estando apaixonada pelo meu "amigo"? Escolhi ocultar os meus sentimentos e tudo que sabia, pra voltar a ser somente amiga. Eu tentei.
Quando não queremos mais impressionar uma pessoa, conseguimos ser nós mesmos, pela lógica é assim que tem que ser. Só que eu não consegui, até porque sou um desastre em forma de gente e acaba sendo inevitável o coração acelerar, eu sempre faço alguma coisa involuntária que me deixa constrangida. Eu pensei estar conseguindo esquecer essa minha paixão, pelo fato de não chorar mais ao ouvir uma música romântica e nem procura-lo como fazia antes. É, eu fui muito ingênua acreditando nisso, dessa forma seria fácil esquecer um sentimento. Dona Thaís ainda é bobinha pra perceber algumas coisas na vida.
Eu tinha certas vontades que, depois de optar por me tornar a amiga novamente, acabei colocando de lado, deixando acumular alguma poeira na gavetinha dos fundos do coração até ser totalmente esquecida. Eu sempre quis beija-lo, tinha vontade de me perder nos braços dele...
"Concentração dona Thaís, não tenha recaídas."
Eu? Tendo recaídas? Definitivamente não! Falei pra Elidinha por ela supostamente insinuar isso quando eu disse que iria convida-lo pra uma festa no sábado.
A Elidinha é uma grande amiga minha. Ou melhor, ela não é grande, talvez de salto. Mas essa grandiosidade se dá pelo fato de estar sempre ao meu lado, aturar minhas chatices e crises existenciais sempre que estava nas minhas fases deprê. Ela conhece bem a minha saga e sabe tudo dessa "Novela mexicana".
Normalmente eu estaria ansiosa com a possibilidade de ele ir ou não a festa, mas me segurei firme. Lá teriam outros garotos, muita gente interessante e eu me sentia forte e segura o suficiente pra não me descabelar por causa dele, por isso nem liguei confirmando o convite.
Fui pra festa com dois amigos e lá encontraríamos o restante do pessoal. No meio do caminho ele me ligou, batemos um papo e ele disse que se melhorasse de uma dor de cabeça apareceria por lá. Tudo bem, isso não estragaria minha noite, não criei expectativas.
Chegamos na festa e encontramos a galera, fui me divertir como há algum tempo eu não fazia. Senti minha alma lavada, tudo recomeçando. Dancei mais do que a própria Beyonce em suas melhores performances e nem me importei quando os meninos se afastaram da gente fingindo sentir vergonha. Eu me sentia plena, feliz. Eu tinha amigos loucos e música, o que mais podia querer?
O celular tocou, era ele. Eu não conseguia escutar direito por causa do barulho, só entendi a parte do: - Deixa que eu encontro você. Ok.
A ansiedade começou, ele poderia aparecer a qualquer momento, de qualquer canto e eu não consegui mais ficar tranquila. O coração foi até a boca e voltou. Olhei pro lado e lá estava ele, vindo na minha direção. Fiz a minha famosa cara de surpresa quando o vejo e fui encontra-lo. Ele sorriu e arregalou os olhos também. Chegamos perto, paramos de frente um pro outro, eu sorri e ele me abraçou. Eu não escutei mais nenhuma música, só quis sentir o abraço apertado, quase estalando os ossos, como há algum tempo não acontecia. Senti a fragrância, o toque. Ele tem um cheiro daqueles que não se quer mais ficar longe, o cheiro de perfume recém passado, que dá na gente a vontade de falar perto do ouvido o tempo inteiro, só pra não perder a lembrança de como é.
Ele me segurou pela mão e me puxou pra dançar, eu sabia que ele dançava bem, mas como eu sou uma menina um tanto quanto desastrada, pedi pra que me ensinasse, seria meu professor. Ele sorriu e disse que eu já sabia dançar. Tá bom eu sabia, mas queria aprender a versão dele.
Eu sempre quis dançar com ele e pouco a pouco a gavetinha que ficava lá nos fundos do coração foi se abrindo, vontades que eu havia guardado e pensei que nem existiam mais estavam saltando novamente uma a uma.
Lembrei da pergunta que a Elidinha me fez.
Não é recaída Thaís, você só está se divertindo. Repetia pra mim mesma tentando me convencer a não criar expectativas.
A noite foi passando e eu só conseguia me concentrar em como ele me tomava nos braços e a gente dançava. Ele me segurava firme pela cintura e eu arrumando sempre alguma coisa pra dizer e ter o que falar no ouvido dele, qualquer besteirinha mesmo, só pra sentir o perfume que eu tinha tanta saudade. Eu ri, me diverti, senti meus olhos brilharem e fiquei em silêncio, com medo. Tentei ser eu mesma, nada de querer impressionar. Podia passar a noite inteira ali, dançando.
Quando cheguei em casa, meus pés estavam doloridos e as pernas latejando. Sentei na minha cama e mentalizei cada gota do perfume que senti. Cada vez que sorrimos com os olhos um pro outro, como se houvessem segredos proibidos de se revelar ali e que se fossem descobertos perderiam a magia e o encanto do momento. Como se só a gente entendesse. Na verdade eu nunca entendo, porque ele sempre foi um mistério pra mim e eu consigo me perder toda vez que olho nos olhos dele. E também porque sou meio burrinha mesmo, mas nunca consigo decifrar o que ele quer dizer, nem o que quer de mim.
É difícil esconder quando os olhos não te deixam mentir. Suas amigas percebem o sorriso bobo a todo instante e a alegria sem motivo, até mesmo na derrota durante uma partida de uno. Quando a Lê me perguntou o que era aquilo,o que estava acontecendo e como estavam as coisas entre a gente, eu me fiz de desentendida: Como assim? Nós somos apenas amigos. Eu falei.
Eu sei amiga, quer dizer, é isso que você quer, ser só a amiga, mas o seu coração não diz isso. Por mais que você queira, o coração não te deixa né? - Ela respondeu.
Eu fiquei em silêncio, sem nada pra dizer. Será que esse sentimento ainda não morreu? Eu sabia disso, a Lê tinha razão. Uma coisa é a gente querer, outra coisa é o coração permitir, só que em toda minha vida eu fui tão emoção, que a razão não se revestia de forças o suficiente pra vencer essa disputa desigual. Eu sei que não posso mais fantasiar essa história, pintando coisas aonde não existem. Já me iludi outras vezes e me machuquei. Não posso por causa dessa minha mania terrível de alimentar esperanças que depois são lançadas ao abismo. Porque em meu coração já foram feitas tantas cicatrizes que precisa de um tempo pra se recuperar dessas loucuras que o amor causa. Eu preciso esquecer, mas o amor não deixa. E Tem sido mais difícil porque até agora eu tô aqui, jurando pra mim mesma que não foi uma recaída, querendo não lembrar o quanto eu gostei daquela noite e controlando essa minha vontade de voltar no tempo pra ele me tomar nos braços de novo e a gente dançar, dançar, dançar...