Sacanagem
A noite estava quieta. Nenhum rumor na rua deserta. Eu andava, com minhas botas cano longo, sobre as poças da água que ficaram como restos após a chuva, enquanto admirava os resultados que ela deixou na paisagem. O céu nublado, o vento, soprando forte... Meu chapéu e minha saia voavam, eu estava com uma mochila estupidamente pesada nas costas, e eu temia. Não pela escuridão em si, mas pela minha vida. Naquela mochila havia o mais valioso colar que o mundo já pusera o olho. E eu, sozinha, tinha acabado de roubá-lo do museu nacional, sem nem ao menos um disparo do alarme! Quanto orgulho...
Continuo caminhando, quando de repente vejo um vulto. Paro, ainda mais temerosa, e seguro firme minha pistola no bolso do casaco. Atravesso a rua e continuo andando, mais cautelosa do que nunca. Caminho mais um pouco e... Há!
"Que brincadeira de mau gosto, Miguel!", eu grito.
Miguel era meu namorado. Lindo, fantástico. Um homem de 22 anos, cabelos pretos até o ombro, olhos azuis radiantes. Um corpo sem igual. Diante disso esqueço do medo e me entrego aos abraços e beijos carinhosos daquele corpo ensopado pela chuva. Ele é um amor.
-Vamos até a minha casa?, eu convido. Ele sorri Daquele jeito que eu adoro e diz um "sim", todo animado.
Chegando lá, eu abro uma garrafa de vinho. Guardo a mochila, cuidadosamente, é claro, numa das gavetas do meu quarto. Ele se senta no sofá da sala, se esticando todo. Diz algo como "que horas são?", enquanto eu sirvo-nos com aquele vinho tinto perfeito, vindo direto da serra. Ele me chama com a mão e eu sento no colo dele. Conversa vai, vinho vem... "Ops, eu já estou alterada", penso. Morta de sono, mas também de desejo, quando vejo ele já está ao meu lado, na cama. Rolamos a noite toda, como se fosse a primeira vez. "Essa é uma das melhores noites que eu já tive...", e me entrego ao momento. Acabo dormindo abraçada nele, quando já deveriam ser umas 5 hs da manhã.
Acordo com uma maldita dor de cabeça e um cansaço sobrenatural. "Onde estou, quem sou eu...?", é, bem assim. Retomo a consciencia, e a memoria. Lembro do que acontecera... A jóia, o Miguel... Pera ae, cade o Miguel? Corro até a janela, por que ouço um barulho de carro, que arranca antes que eu veja quem era. Tropeçando nas roupas espalhadas pelo chão, eu vou, surtada, até a gaveta.
-Filho da puta! em alto e bom som. O desgraçado me roubou! Como eu pude ser tão ingênua e cair na dele??
Pois é... E o mais absurdo disso é que na noite anterior eu driblei a segurança do musei, os guardas, as cameras e alarmes... E ainda duas vezes, ida e volta. Mas fui trapaceada sutilmente por um homem só. E um homem lindo, 22 anos, fantástico. Olhos azuis, corpo sem igual...
(muahauhauhauhauahuahua)