Fama e dinheiro, muito dinheiro
FAMA E DINHEIRO, MUITO DINHEIRO
(crônica publicada no jornal "Diário Catarinense" de 04.08.2010)
Dois goleiros frequentam, no momento, a mídia nacional: Bruno, de 25 anos, que atuava no Flamengo, e Renan, 19, do Avaí. O primeiro sonhava com a Seleção brasileira, a que nunca chegou, e jogou fora a carreira e boa parte da vida ao decidir eliminar a namorada, amante ou o caso fortuito - de qualquer forma, a mãe do seu filho; de imediato, vai perder a fortuna no bolso dos advogados que contratou para salvar a ele e a toda sua corte, igualmente envolvida no assassinato ainda sem cadáver da moça que sonhava ser modelo.
Renan certamente pensava na possibilidade da Seleção como todo escritor pensa na eventualidade do Nobel. Mas a Seleção chegou para o goleiro avaiano da forma como chega a morte: inesperadamente, ainda que merecidamente.
Bruno faturava, dizem, 250 mil reais por mês, mais outro tanto de patrocínios pessoais que já foram cortados - ninguém ganha mercado com propaganda na penitenciária (a menos que seja de droga, arma ou celular). Já o Renan, até outro dia goleiro dos juniores do Avaí, terá hoje, com certeza, um salário muitíssimo mais modesto.
Quinhentos mil é muita coisa. Em sã consciência, ninguém precisa de meio milhão por mês todos os meses. Especialmente quando não tem a mínima estrutura educacional e cultural. Bota essa grana incontável na mão de um sujeito desses e ele cria a sua mafiazinha particular, pois o que não falta é gente para servi-lo incondicionalmente. O que não falta é gente para vender-lhe de tudo: de orgias bombásticas a assessorias jurídicas infalíveis. E toca a tirar dinheiro do trouxa, que ele nem vai perceber.
De quem é a culpa, afinal? Dos clubes. Pois os clubes de futebol não apregoam estrutura de empresa? E o que faz uma empresa que paga altos salários? Treina os funcionários, do apertador de parafusos ao executivo de alto potencial, este das fortunas todo mês. E o treinamento, formal e informal, não se restringe a questões técnicas, profissionais: é voltado, também, ao crescimento pessoal, humano.
Pois é isto o que os clubes (e patrocinadores, e empresários) precisam fazer: pagar a metade do que pagam aos jogadores e investir a outra metade em educação e formação cultural dos atletas e, também, dos seus demais funcionários. E salvar os Renans que estão chegando e os Brunos que ainda não se perderam.
Lavar as mãos, depois, é atitude simplista. Pra não dizer cínica.
(Amilcar Neves é escritor com sete livros de ficção publicados, diversos outros ainda inéditos, participação em 32 coletâneas e 44 premiações em concursos literários no Brasil e no exterior)