Máximas do Zé Ferreira
Assim como o saudoso jornalista Sérgio Porto – mais conhecido pelo pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta – lançou livro intitulado “As máximas da Tia Zulmira”, de frases supostamente ditas pela “ermitã da Boca do Mato”, recheadas de bom humor, por que não posso falar das máximas do Zé Ferreira, o filósofo ermitão do Rebentão dos Ferros?
E justifico o meu pensar: Sempre que podia, o matuto Zé Ferreira entremeava sua fala com algum ditado popular, normalmente relacionado a bichos e coisas do seu mundo rural. Eu sempre achei aquilo de uma profunda sensibilidade.
Pragmático e observador atento das “coisas e cousas” da Natureza, “e do ó da raposa” rosiano, as tiradas do Zé Ferreira faziam parte das tradições orais daquele seu pequeno mundo, nos arredores de Montes Claros. Na maioria das vezes, as frases eram forjadas por ele mesmo. E nisso residia o brilho de suas observações. Macacos, muares, bovinos, aves, peixes, anfíbios e mais uma variada quantidade de espécies desfilavam constantemente pelo seu discurso cheio de sabedoria.
Fiquei a refletir comigo sobre o porquê de os pensadores – como o matuto Zé Ferreira – se utilizarem do comportamento dos animais dito irracionais para explicar, na realidade, a sagacidade do comportamento humano. Seria para não ferir a susceptibilidade dos ditos racionais, camuflando suas atitudes?
De relance, lembrei-me de alguns de seus aforismos, que de vez em quando ele soltava, logo após um “cumo lá diz”. Vejamos alguns, sobre o perigo oferecido pelas vorazes piranhas: - Em rio que tem piranha macaco bebe água em canudinho; - Lagoa que tem piranha jacaré nada de costas.
Sobre frangos, galinhas, galos e patos, assim falava Zé Ferreira: - Frango que acompanha pato morre afogado; - Pé de galinha não mata pinto; - Onde o galo canta, janta; - Para galo velho, poleiro baixo; - A galinha que cantou primeiro é dona do ovo; - De grão em grão, a galinha enche o papo.
Sobre papagaios e periquitos, observava: - Papagaio come o milho periquito leva a fama; - Papagaio que acompanha joão-de-barro vira ajudante de pedreiro; - Papagaio velho não aprende a falar.
Também observava o comportamento das laboriosas formigas: - Formiga esperta não corta perto do formigueiro; - Quando a formiga quer se perder, cria asas.
As lagartixas foram lembradas pelo Zé Ferreira: - Lagartixa esperta não cai de parede lisa; - Lagartixa sabe onde bate com a cabeça; - Quem nasceu pra lagartixa não chega a jacaré.
E dos velhacos macacos, cachorros e gatos? O filósofo do Rebentão não os esqueceu: - Macaco velho não enfia a mão em cumbuca; - Cada macaco no seu galho; - Cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça; - Gato escaldado tem medo de água fria; - Em casa que não há gato, folga o rato; - Cachorro que late não morde; - Quem nasce pra cachorro morre latindo; - De noite todos os gatos são pardos.
Das aves, de sua bem-querência, ele filosofava: - É melhor um passarinho na mão que dois voando; - Em festa de jacu nhambu não entra; - Quem gaba o toco é coruja; - Praga de urubu magro não mata cavalo gordo; - Quem quer pegar passarinho não fala xô!; - Quem tem dó de pica-pau dá a ele um machado.
Dos cavalos, bois e vacas, que ele ajudava a olhar para o “seu” Nivaldo, também fez observações: - Cavalo dado não se olha os dentes; - Cavalo amarrado também pasta; - Cavalo velho, capim novo; - Boi sonso a chifrada é certa; - Boi, em terra alheia, vira vaca; - Para cavalo comedor, cabresto curto; - Tamanho de boi não é gordura.
De porcos e tatus, que chafurdam na terra, Ferreira também tinha sua opinião: - Quem nasce pra tatu morre cavando; - Porco magro é que suja a água; - O dono da roça é que sabe onde os porcos entram.
Finalmente, quis saber dele algo que me intrigava:
- Zé Ferreira, gostando destas coisas como gosto, como é que eu o descobri no Rebentão?
E ele, sem pestanejar, foi curto e grosso:
- Uai, Tamaury, um gambá cheira o outro...
Esse Zé Ferreira...