O POVO DE SANTO

A partir de 1550, contingentes de africanos foram trazidos para o Brasil para serem escravizados, utilizados como serviçais em todos os tipos de serviços e barbaramente maltratados pelos seus ditos “senhores”. Vieram homens e mulheres de diversas partes do continente africano, africanos de várias etnias, pertencentes muitas vezes a nações inimigas entre si, falantes de diferentes idiomas e dialetos foram aqui misturados para que se tornasse possível a dominação dessas pessoas. Foram tomadas todas as devidas precauções para que os mesmos perdessem a sua identidade e auto-estima.

Inicialmente ninguém se entendia tal era a diversidade de línguas faladas por essas pessoas, mas com o correr do tempo começaram a se comunicar por intermédio do tupi, a língua da terra e a partir daí, apesar de maltratados passaram a demonstrar uma estranha forma de poder proveniente de algo que os dominadores nunca poderiam imaginar: as suas crenças.

Ninguém poderia imaginar que a religião desses homens e mulheres poderia proporcionar uma união sem precedentes. Eles já professavam uma das mais antigas religiões do mundo, extremamente diferente do pensamento e das crenças ocidentais, e que aparentava uma quase uniformidade entre as diversas etnias.

Foi no Brasil e alguns países das Américas onde se adotou o sistema escravocrata que se pode observar a força dessa poderosa crença que apesar das perseguições se manteve intacta com o passar dos anos, revelando-se uma força bastante poderosa.

Afinal ninguém pode contra as forças da natureza, as plantas, as ervas, as flores. A religião da alegria, da vontade de viver, do princípio e do fim. A religião do extremo conhecimento onde o bem e a ausência do bem são conciliáveis. Quem pratica o bem é reconhecido plenamente pelas forças superiores e por Olorum (Deus); quem pratica o mal, mais cedo ou mais tarde esse mal pode se reverter contra si.

Para que fosse possível a realização das cerimônias religiosas, sabiamente foi forjado um sincretismo religioso onde cada “orixá” (entidade, mais conhecida como “santo”) correspondesse a um santo católico cuja ação fosse semelhante. Assim o povo de santo foi firmando a sua religiosidade no país.

É o povo de santo que mais conhece de ecologia e da própria natureza. Cada orixá em si além de ser intermediário entre Deus e os homens, corresponde a uma força (física) da natureza e os adeptos da religião dos “orixá” conhecem perfeitamente os segredos das ervas e plantas medicinais para todos os sentidos.

Os sacerdotes dessa religião conhecem também os segredos da ecologia (das fontes, dos rios, dos mares e da terra), onde essa ou aquela árvore pode ser plantada para contribuir com a fertilidade do solo ou para a conservação de mananciais e nascentes.

O preconceito aos africanos e suas manifestações culturais sempre foi muito grande no Brasil. O povo de santo tem sido demonizado por aqueles ignorantes, inescrupulosos e por isso mesmo preconceituosos mas é sabido que demônios foram criações do cristianismo para amedrontar os fieis e torná-los subservientes. Não existem demônios nas crenças africanas. Para funcionamento dos seus templos religiosos era necessária permissão da polícia, inclusive essas manifestações foram perseguidas pelas autoridades até pouco tempo.

Modernamente as políticas educacionais e de reparação vêm conseguindo minimizar a segregação e as práticas racistas, com essas ações, o “povo de santo” vem alcançando o merecido reconhecimento.