Monumento a Ariano Suassuna e a onipotência do divino e da ignorância

Passando na Lagoa do Parque Solon de Lucena, encontro o poeta Gilberto Bastos na tarefa de erguer uma estrutura para abrigar exposição de fotografias de João Pessoa, cidade aniversariante da semana que vem. Junto, os mistérios do folclore visto pelo escritor paraibano/pernambucano Ariano Suassuna, o Monumento da Pedra do Reino.

É de justiça reconhecer que o monumento enriquece a Lagoa, um sítio belíssimo. A lagoa do Parque Solon de Lucena encantou um dia o folclorista potiguar Câmara Cascudo. Ele mandava cartões postais da Lagoa para seus amigos correspondentes no mundo todo.

O totem de Ariano é obra de Miguel dos Santos, “uma homenagem ao imaginário do povo paraibano e brasileiro". Chama-se Pedra do Reino, mesmo nome de um livro de Suassuna. A escultura tem oito metros, feita de concreto, aço e cerâmica. Em cima, duas caras; uma olha para o sertão e a outra espicha a vista em direção ao oceano. O autor da obra explica que a cara do sertão é do próprio Ariano, e a outra é do seu pai, João Suassuna, ex-presidente da Paraíba e inimigo de João Pessoa. É um caso único de escultura francamente nepotista.

Paraíba pequena e provinciana! Quando o prefeito Coutinho estava pra inaugurar a estátua da família Suassuna, o povo dos perrepistas andou queimando ruim, falando cobras e lagartos das pedras de Taperoá, terra de Ariano. Na escultura, o artista representa alguns bichos em extinção, feito a onça, o tamanduá, o lobo-guará, cascavel e carcará. Esqueceu dos perrepistas e liberais, facções que se digladiavam nos idos de 30 e que ainda hoje trocam farpas e imbecilidades.

A obra apresenta 500 pontas de aço, quatro cavalos, quatro onças aladas, estrelas e outros símbolos cabalistas. “Respeito a estética popular. Espero que o povo se veja aqui”, disse o autor Miguel dos Santos. O povo passa desconfiado, olha a escultura e sai sem entender nada. O turista bate fotografias e o guarda municipal faz a segurança. Por enquanto não se registrou nenhum atentado à obra, mas já foram vistos umbandistas queimando incenso e oferecendo dádivas aos seus orixás ao pé da escultura. O ritual foi registrado pela câmera de TV que monitora o local durante 24 horas. Doidos e profetas, budistas, taoistas, o pessoal do rastafári e até a turma de uma religião estranha chamada Mama Tata ou Mama Chi, já rondaram a estátua, percebendo nela sinais do divino. Mama Tata é uma seita cristã cujos membros acreditam que Deus aboliu todas as igrejas e se relaciona somente com eles. Um profeta Mama Tata acredita que a escultura da Pedra do Reino seja o sinal revelador de Deus, que vai descer do céu à terra, justamente na Lagoa Solon de Lucena.

O patrocinador da obra, adorador do Deus mercado, acredita apenas na frágil resistência do humano aos apelos do Marketing.

Eu sou um cara de pouca fé, que gostaria de acreditar em alguma coisa. Estava ao pé da escultura da Pedra do Reino quando fui abordado por um membro da Igreja Universal dos Poderes Cósmicos. Fiquei sabendo que essa religião tem mais de 150 mil membros no mundo todo. É baseada no budismo, cristianismo, misticismo, paranormal e alquimia. A religião acredita em Elfos, fadas, manas e espíritos da natureza. Sustentam que a Pedra do Reino é o símbolo de sua religião e que Ariano é o profeta. Já outros crentes acham que o profeta é o Mago. Movimento chamado “Coletivo do Girassol Divino” já organiza a queima simbólica de títulos eleitorais na fogueira santa ao pé do monumento. Tudo isso eu fiquei sabendo em apenas alguns instantes parado ao lado da escultura, ouvindo testemunhos de moradores de rua, guardas e outros mentirosos. Meu compadre Gilberto Bastos é testemunha.

Fábio Mozart
Enviado por Fábio Mozart em 30/07/2010
Código do texto: T2408849