A OCASIÃO FAZ O LADRÃO

O “ladrão”, no caso, sou eu! Sim, senhores, um ladrão de oportunidades, de momentos que surgem na vida da gente, sejam na labuta diária, na vida doméstica, nos passeios, férias, viagens e ocasiões de puro divertimento (ou não), enfim, na observação atenta do cotidiano. Assim eu transformo essas observações na escrita do que chamo de “Crônicas do Cotidiano”, isso desde rapazinho nos meus tempos de estudante ginasial.

Numa dessas, em fevereiro do ano de 1994, sofri um infarto (leve) e fui socorrido no “Hospital Medicor”, na Baleia, um recanto bucólico de Bêagá, cercado de mata fechada, flores, riachos e passarinhos. Nesse hospital passei exato quatorze dias, sendo sete dias internado na “UTI” e mais sete no “CTI” (Centro de Tratamento Intermediário), local onde os infartados e outros pacientes ficavam em observação, depois da fase aguda dos males que os afligiam, até sua alta completa.

E aí foi que refleti bastante, fiz a leitura do maravilhoso livro “Paulo e Estevão” e, aproveitando a ocasião, rabisquei algumas crônicas (“A miséria da condição humana”, “Leri, o diabético”, “Antonio, o chagásico”, “O banho” e “Nos bastidores da UTI”.

Uma tarde, bem depois do almoço e antes do café vespertino, estava eu rascunhando uma historinha dessas, quando entrou uma jovem médica fazendo o que chamavam de “corrida de leitos”. Examinou os pacientes dos primeiros boxes e, antes que chegasse a mim, parei de escrever e escondi o caderno sob os travesseiros. Mas ela notou e, sorridente, chegou-se e falou, enquanto tomava minha pressão:-

“- Ah, mas o que é que o senhor tanto escrevia nesse caderninho, heim??? ...”

“- São casos do dia-a-dia, doutora. É que gosto muito de ler e escrever, sabe? E hoje acordei inspirado. Escrevo o que chamo de “Crônicas do Cotidiano”.

“- Mas o senhor está tirando “casos” daqui da “UTI” para as suas crônicas?”

“- Sim, senhora. É só prestar atenção e eles vão surgindo, conforme as ocasiões.”

“- Ah, mas eu gostaria de ler algumas dessas histórias, posso? ...”

“- Claro, doutora. Deixe-me receber alta e passá-las a limpo, ok?”

O diabo é que até hoje, mais de dezesseis anos depois, a doutora não tomou conhecimento dos casos relatados, pois ela era médica visitante, digamos assim. Jamais retornou ao “Medicor”, pelo menos enquanto eu estive lá internado. Mas milhares de pessoas tiveram acesso aos textos, amigos e leitores do “Recanto das Letras”, por exemplo.

Dest'arte, a ocasião fez o ladrão! ...

-o-o-o-o-o-

B. Hte., 29/07/10

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 29/07/2010
Reeditado em 29/07/2010
Código do texto: T2406968
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