Bella Ciao!
- Acoooordaaaaa!! Beeeelaaaaaa!!!
- Quer parar de gritar no meu ouvido??!!
- Putz!! Até que enfim!! Tô tentando te acordar há horas!!
- Também!! Você viu o tanto de anestesia que me injetaram??
- Vi... Duas seringonas cheias... Nem precisava tanto. Na metade da primeira você já estava grogue... Fracota!!
- Jade??
- É ieu meisssss!
- Mas... eu pensei que você estivesse...
- Morta? Eu tô!
- E como eu estou falando com você?
- Adivinha, loirinha...
- Quer dizer que eu... Ah! Isso explica aquelas caras...
- Eu teria desconfiado daquela carninha cozida... Jeitão de última refeição...
- Nem me toquei... Eles já vinham me dando umas comidinhas mais caprichadas, uns risotos e tal... Queriam que eu engordasse um pouco, para encarar a cirurgia. Mas, as caras! Nunca tinha visto a Nena tão séria...
- É uma decisão complicada... Depois que a médica te apagou ela chorou muito...
- Puxa! Lamento tê-los feito passar por isso...
- Ah! A morte sempre é difícil para quem fica... Eu morri de repente e eles também sentiram muito. Pensa pelo outro lado: você lhes deu muitas alegrias... Uma coisa que não saía da cabeça dela hoje era a lembrança de você debruçada na janela do quarto deles de manhã, pedindo carinho.
- Eu era um filhote. Mal alcançava a janela. Mas adorava ir acordar os dois...
- Eles gostavam.
- O chato é que logo eles vão passar por isso de novo... O Lampião também não está nada bem.
- É... A Ágata já está planejando a recepção para ele.
- Ágata?
- Tá vendo aquela doberman bonitona lá? Era dos vizinhos. Estava com Leishmaniose.
- Ué! Mas, isso não tem tratamento?
- Tem. Mas, muita gente não sabe. E o próprio governo prefere incentivar os sacrifícios, espalha o pânico e tal... É mais fácil que fiscalizar os remédios e combater o mosquito transmissor...
- Triste, quando quem tinha a obrigação de informar prefere deseducar, né?
- É...
- Bem... Mas, vamos falar de coisas boas...
- E o que pode ser bom em estar morta?
- Ah! Montes de coisas. Para começar, não sei se você notou... Tá sentindo alguma dor?
- É mesmo!! Nada! Estou ótima!
- Sim. Aqui não há doença...
- Mas, fome eu estou sentindo...
- Beleza! Já chamei todo mundo para a sua festinha. A Ayrinha, o Blue, o Veludo, a Samantha, o Iron, o Black... Lembra que foi ele quem te ensinou as regras da casa?
- Claro que lembro. Puxa! Vou adorar ver todo mundo... Mas, comer... Nem me animo. Tudo o que eu como, eu ponho pra fora...
- Isso era lá, minha irmã. Aqui, é diferente.
- Oba!!! E como é a ração por aqui?
- Que ração?? Aqui come-se o maná. E o gosto é o que se desejar: frango, picanha, ovo frito...
- Ovo frito?? Só você mesma, Jade, para pensar em ovo frito.
- E mamão com gosto de fruta roubada de cima da geladeira...
- E manga? Lembro que você adorava... Quando caía uma do pé... Lembrei que a Nena falava que você era, literalmente, o “cão chupando manga”!
- É! Eles plantaram uma mangueira onde me enterraram... Parece que você vai ficar ao meu lado, lá.
- Que bom... Outra coisa que eu sinto saudade são nossas brigas... Pena que me machucavam tanto...
- Ah! Aqui também podemos brigar o quanto quisermos... Nada machuca! Posso morder à vontade esse seu traseiro gordo.
- Gordo!!! Ficou cega, mana? Não vê que eu estou só pele e osso?
- Hum hum! Dá uma olhada neste espelho...
- Uau-au!!
- Pois é... Aqui permanecemos com a nossa melhor forma física... Embora no seu caso não ajude muito: você sempre foi feia à beça! Rá-rá!
- Engraçadinha!
- Eu também estava bem magra quando morri, mas dá uma olhada nesses músculos...
- Músculos, sei! Pra mim, isso é banha!
- Ai, Belinha! Tava com saudades de você...
- Sabe que eu também? Você era chata pacas, mas eu senti sua falta... Dá aqui um cheiro!
- Certo, certo! Agora vamos... O maná nos espera.
- Estranho... Tô vendo cachorros, gatos, cavalos, bois... Mas, não estou vendo pessoas por aqui...
- É porque aqui é o céu.
- E as pessoas não vêm para o céu??
- Não.
- E para onde é que elas vão?
- As más, voltam como gente até se tornarem pessoas melhores.
- E as outras?
- Voltam, como bichos, para tornar o mundo melhor.
****
Com carinho, para duas cachorrinhas queridas que fizeram parte de nossa vida.
Na imagem, uma foto da Bela em 2008.
Ela partiu neste sábado ao encontro da irmã, deixando muita saudade por aqui.
- Acoooordaaaaa!! Beeeelaaaaaa!!!
- Quer parar de gritar no meu ouvido??!!
- Putz!! Até que enfim!! Tô tentando te acordar há horas!!
- Também!! Você viu o tanto de anestesia que me injetaram??
- Vi... Duas seringonas cheias... Nem precisava tanto. Na metade da primeira você já estava grogue... Fracota!!
- Jade??
- É ieu meisssss!
- Mas... eu pensei que você estivesse...
- Morta? Eu tô!
- E como eu estou falando com você?
- Adivinha, loirinha...
- Quer dizer que eu... Ah! Isso explica aquelas caras...
- Eu teria desconfiado daquela carninha cozida... Jeitão de última refeição...
- Nem me toquei... Eles já vinham me dando umas comidinhas mais caprichadas, uns risotos e tal... Queriam que eu engordasse um pouco, para encarar a cirurgia. Mas, as caras! Nunca tinha visto a Nena tão séria...
- É uma decisão complicada... Depois que a médica te apagou ela chorou muito...
- Puxa! Lamento tê-los feito passar por isso...
- Ah! A morte sempre é difícil para quem fica... Eu morri de repente e eles também sentiram muito. Pensa pelo outro lado: você lhes deu muitas alegrias... Uma coisa que não saía da cabeça dela hoje era a lembrança de você debruçada na janela do quarto deles de manhã, pedindo carinho.
- Eu era um filhote. Mal alcançava a janela. Mas adorava ir acordar os dois...
- Eles gostavam.
- O chato é que logo eles vão passar por isso de novo... O Lampião também não está nada bem.
- É... A Ágata já está planejando a recepção para ele.
- Ágata?
- Tá vendo aquela doberman bonitona lá? Era dos vizinhos. Estava com Leishmaniose.
- Ué! Mas, isso não tem tratamento?
- Tem. Mas, muita gente não sabe. E o próprio governo prefere incentivar os sacrifícios, espalha o pânico e tal... É mais fácil que fiscalizar os remédios e combater o mosquito transmissor...
- Triste, quando quem tinha a obrigação de informar prefere deseducar, né?
- É...
- Bem... Mas, vamos falar de coisas boas...
- E o que pode ser bom em estar morta?
- Ah! Montes de coisas. Para começar, não sei se você notou... Tá sentindo alguma dor?
- É mesmo!! Nada! Estou ótima!
- Sim. Aqui não há doença...
- Mas, fome eu estou sentindo...
- Beleza! Já chamei todo mundo para a sua festinha. A Ayrinha, o Blue, o Veludo, a Samantha, o Iron, o Black... Lembra que foi ele quem te ensinou as regras da casa?
- Claro que lembro. Puxa! Vou adorar ver todo mundo... Mas, comer... Nem me animo. Tudo o que eu como, eu ponho pra fora...
- Isso era lá, minha irmã. Aqui, é diferente.
- Oba!!! E como é a ração por aqui?
- Que ração?? Aqui come-se o maná. E o gosto é o que se desejar: frango, picanha, ovo frito...
- Ovo frito?? Só você mesma, Jade, para pensar em ovo frito.
- E mamão com gosto de fruta roubada de cima da geladeira...
- E manga? Lembro que você adorava... Quando caía uma do pé... Lembrei que a Nena falava que você era, literalmente, o “cão chupando manga”!
- É! Eles plantaram uma mangueira onde me enterraram... Parece que você vai ficar ao meu lado, lá.
- Que bom... Outra coisa que eu sinto saudade são nossas brigas... Pena que me machucavam tanto...
- Ah! Aqui também podemos brigar o quanto quisermos... Nada machuca! Posso morder à vontade esse seu traseiro gordo.
- Gordo!!! Ficou cega, mana? Não vê que eu estou só pele e osso?
- Hum hum! Dá uma olhada neste espelho...
- Uau-au!!
- Pois é... Aqui permanecemos com a nossa melhor forma física... Embora no seu caso não ajude muito: você sempre foi feia à beça! Rá-rá!
- Engraçadinha!
- Eu também estava bem magra quando morri, mas dá uma olhada nesses músculos...
- Músculos, sei! Pra mim, isso é banha!
- Ai, Belinha! Tava com saudades de você...
- Sabe que eu também? Você era chata pacas, mas eu senti sua falta... Dá aqui um cheiro!
- Certo, certo! Agora vamos... O maná nos espera.
- Estranho... Tô vendo cachorros, gatos, cavalos, bois... Mas, não estou vendo pessoas por aqui...
- É porque aqui é o céu.
- E as pessoas não vêm para o céu??
- Não.
- E para onde é que elas vão?
- As más, voltam como gente até se tornarem pessoas melhores.
- E as outras?
- Voltam, como bichos, para tornar o mundo melhor.
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Com carinho, para duas cachorrinhas queridas que fizeram parte de nossa vida.
Na imagem, uma foto da Bela em 2008.
Ela partiu neste sábado ao encontro da irmã, deixando muita saudade por aqui.