Só sete e cinquenta

Oi, gente. Aqui é Dona Menô.

Eu quis fazer um café da manhã romântico para Josualdo. Nada mais agradável do que café da manhã romântico. Nada como começar o dia sorrindo!

Comprei pra ele caviar rosa. Caviar é coisa cara aqui no Brasil, se bem que é igual a arroz com feijão lá na terra de Gisa, minha amiga da Suécia, que, por sua vez, a esta hora reza pelamordedeus por um pouco de mexidinho.

Lá estava Josualdo pelado, só com um roupão de toalha, doido pra colocar um short e camiseta, mas eu disse que não cairia bem. Ele tentava descolar os bagos que grudavam na cadeira, mas, tudo bem, fazia parte...

Preparei uma mesa fenomenal, com tudo que tinha direito, mas quando me dei conta, ele tinha sumido. Tinha ido ao Fendas, o mercado aqui pertinho de casa, pois ele não passa sem mortadela, queijo bola e pão frescos.

Aquilo meu deu certo nervoso, pois eu tinha croissant quentinho e caviar pro nosso antepasto. Sim! Antepasto, sim - porque depois do desjejum eu pensava em ser comida, entenderam?

Pois é... Josualdo chegou do mercado. O saco de plástico exalava aroma de pobreza para a sala inteira, escondendo o perfume de incenso de jasmim que eu tinha acabado de acender...

Não perdendo a esportiva, coloquei café em sua xícara. Depois lhe perguntei se preferia adoçante, ao que ele quase teve um treco: “Ta doida, mulher?! Veneno não!”. Não adiantava ser muito classuda com Josualdo...

Uma mulher precisa ter tato e chegar a um denominador comum com seu amado. Não adianta entrar de sola numa relação, muito menos nos gostos gastronômicos dele, portanto, para que Jo provasse caviar, eu tinha que fazer certa misancene:

- “Amor, você já provou o caviar rosa?”.

Josualdo, depois de uma mordida no sanduíche de mortadela, perguntou: “O que é caviar?”.

Respondi: “Ovas não fertilizadas de esturjão!”.

E ele: “O que é esturjão?...”.

- “Po, Jo! É um peixe do mar Cáspio!”.

- “Não sei onde é isso, não, mas, pelo jeito, é longe pra caramba. Esta merda deve estar estragada...”.

Não havia jeito de Josualdo comer a iguaria e eu comecei a achar que ele era um troglodita. Mesmo assim, insisti: “Prove o pão que comprei. Coma com o caviar...”.

Ele começou a reclamar que eu estava comprando coisa demais e que aquilo devia ter custado os olhos da cara. Eu expliquei que o caviar, que era pouquinho, deu sete e cinquenta.

- “Como sete e cinquenta?! Você comprou isso no Fendas?! Deve ser genérico...”.

Eu disse pra ele que genérico, só remédio do governo, ao que ele concordou que dava no mesmo... Porém, para ser educado, pescou um pouco do patê que eu oferecia e colocou na ponta da língua. Esperei para ver sua reação, que foi a melhor possível! Senti que eu começava a inserir meu parceiro no mundo dos socialites!

Logo a seguir ele pegou metade de um pão francês e passou no pote do caviar, o que acabou esvaziando o mesmo. Comeu com sofreguidão. Achei aquilo, apesar de grotesco, muito bom, pois dei a ele prazeres nunca dantes sentidos – e olhem que na minha idade isso é uma vantagem...

- “Menô, isso é bom pra cacete!”.

Achei que Josualdo estava exagerando, uma vez que caviar, à primeira mordida, não é bom pra cacete. A gente precisa treinar o cérebro, o olfato e o paladar pra perceber que caviar, apesar de molosconhento e fedido, é bom pra cacete...

Experimentei aquilo que eu comprei a sete e cinquenta e vi a razão de ser tão barato: maionese e alho puros! O aspecto era de um mingau branco com algumas bolinhas rosas aqui e ali.

- “Menô, que delícia! Maionese e alho: tudo de bom!”.

Leila Marinho Lage
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Leila Marinho Lage
Enviado por Leila Marinho Lage em 26/07/2010
Reeditado em 29/07/2010
Código do texto: T2400257
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