Dia dos avós (EC)

Não sabia que existia o dia dos avós. A data não é veiculada na grande mídia e é fraco o apelo comercial em torno dela. Isso não significa, é claro, que os vovôs e vovós não mereçam homenagem, muito pelo contrário. Se eles não existissem, também não existiriam os nossos pais, não existiríamos. O milagre da vida e da existência devemos a eles. Mas não basta simplesmente existir, não basta ser avô ou avó - é preciso participar.

Meus avós tinham uma dificuldade quase patológica em expressar amor. Todos eles eram extremamente formais, como se engessados emocionalmente. Nós, netos, sempre os cumprimentávamos com um aperto de mãos. Nada de mimo, colo, afago, beijos e abraços como eu observava nas relações de alguns amigos e seus avós. Nada de passeios, conversas, presentes ou telefonemas para desejar feliz aniversário. Dizer "eu te amo" então, um disparate. Não existia laço de amizade ou vínculo afetivo, somente o respeito e uma injustificável e insensível distância. É claro que esse comportamento era recíproco, nós aprendemos a tratá-los da mesma forma como éramos tratados desde a infância.

Sobre o passado deles posso afirmar com convicção que foram batalhadores, verdadeiros guerreiros. Ao chegarem ao Brasil como imigrantes, trabalharam em lavouras de café em condições precárias, quase como escravos. A Segunda Guerra Mundial foi motivo de muita dor e sofrimento, minha avó paterna sempre falava dos familiares que morreram na explosão da bomba atômica em Hiroshima. E apesar da participação quase nula do Brasil na guerra, houve muita discriminação e preconceito para com os japoneses aqui residentes. O bisavô de minha esposa chegou a ser preso apenas por ter falado em japonês em público. Absurdos da guerra. Certamente essas experiências amargas, que nós da terceira geração fomos poupados, endureceram ainda mais seus corações já cansados pela distância da família e da terra natal.

E apesar de todas as dificuldades que enfrentaram, eles venceram. Posso dizer com alegria: conquistei a oportunidade, com dificuldade e muito esforço, de ter estudado em uma conceituada universidade pública de São Paulo, lugar onde, inclusive, trabalho hoje. Quase todos os netos obtiveram formação superior, alguns conseguiram bolsas para estudar no exterior, e todos têm uma vida honesta, de trabalho dedicado e responsável. Por isso digo que meus avós venceram.

Sei que de onde estão nos olham com alegria e orgulho. E hoje gostaria de dedicar-lhes uma oração: vovós, sinto não ter lhes dito antes o que agora lhes digo em meu coração mas que, de alguma forma, sei que vocês já sabiam: eu os amo, do meu jeito, sempre os amei. Obrigado por tudo.

Julho de 2010

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Este texto faz parte do exercício criativo "Dia dos avós".

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