VERGONHA ALHEIA? EU SINTO! - PARTE I

Eu sinto vergonha alheia e você?

Não quero fazer referência à vergonha alheia em relação aos nossos queridos representantes políticos. Seria desgastante. Não cronicarei sobre eles, portanto. Tenho vergonha.

Agora... Vamos combinar?! Você nunca sentiu aquele constrangimento diante de situações esquisitas corriqueiras envolvendo um terceiro? É isso mesmo: quando este nos presenteia com alguma atitude, no mínimo, estrambótica, diante de outras pessoas.

Vou tentar elencar algumas cenas.

Dia de sol, excursão com familiares e amigos, cidadezinha turística lotada - de sacoleiros, claro. Eu estava com algumas amigas andando pelo agradável centro comercial, quando, do nada, surge em nossa frente uma senhora toda pomposa. Passeava olhando vitrines.

Inesperadamente, nossos olhos, que também buscavam um lançamento da moda, são chamados à atenção. Não hesitantes, captam uma surpreendente cena: aproximadamente 50 centímetros de papel higiênico - folha dupla - preso no cós de sua calça, bem no traseiro. Ali, como acessório do modelo jeans, pendurado e bailando sob o vento brando daquela tarde parcialmente coberta pelos retalhos de sobra.

Olhares se cruzaram e as básicas risadinhas escaparam involuntariamente. A pergunta? Única: como aquilo fora parar ali? O sentimento foi unânime: vergonha alheia.

Trágico. A cena estava ali e todos puderam assistir.

Diferentemente do dia em que eu, no caminho para o trabalho, em minha viagem intermunicipal, fui surpreendida por um bilhete. Tudo tão afetuoso! Só ele - o protagonista - e eu pudemos sentir a tão singular emoção.

É curioso quando se viaja muito tempo em um único horário. Motorista e cobrador são sempre os mesmos. A gente acaba acostumando até com o bom dia deles, e, semana após semana, isso gera uma gostosa sensação de confiança.

Foi em um desses trajetos, que o simpático cobrador - depois de tomar uma copiosa coragem, creio eu -, sorriu para mim, exclamou o bom dia de costume, recebeu o valor da corrida, ofereceu-me o troco e junto dele - surpresa!!! -, a passagem com um bilhete no verso. Discretamente peguei e fui me sentar no fundo do ônibus, ansiosa para ler o dito cujo. Mulher é fogo mesmo. Sentei-me e desfiz a dobra: "Oi, tudo bem? Você é linda. Gostei muito de você. Aceita sair 'com migo'? Telefone: 8...-....". Nossa, quanto sentimento! - pensei. Lentamente levantei a cabeça e dei aquela olhada por baixo. Ele, tímido, contraía ligeiramente seus músculos faciais, eu gargalhava por dentro. Permaneci imaginando o que ele poderia estar pensando sobre o que eu estava pensando. Fui incapaz de raciocinar qualquer coisa. Apenas senti: vergonha alheia. Ele foi muito corajoso; estava em horário de trabalho. Que carão, coitado! A caligrafia e ortografia do bilhete teriam extinguido todas as chances se estas existissem. Foi hilário. E no dia seguinte, dei um fora educado e discreto quando passava pela catraca. O apaixonado esboçou um risinho sem graça. Nem foi preciso escrever "não posso e não desejo sair 'com tigo' ".

Estou aqui contando situações envolvendo terceiros, todavia não posso deixar de citar que já fiz alguns amigos sentirem vergonha alheia. Fiz sim, eu sei, mas isso é inerente ao modo do meu ser. Tem momentos em que não filtro muito minhas emoções e dá nisso. Alguns só pensam. Eu penso e falo, e daí?

Meu namorado me apelidou de super-sincera. Está aí! Este sente uma vergonha alheia danada de mim. Só de eu contar algumas das minhas boas ações, ele fica vermelho. Por exemplo: ele não acha bacana "discutir" com caixas de supermercado quando me dão troco errado. Se me voltam dinheiro a mais eu devolvo, por que eu estaria errada em querer o que é um direito meu?! Qual o mal em comunicar ao gerente do estabelecimento que não vou levar determinado produto da prateleira porque está com a data de validade vencida? Não acho isso demais. Pago impostos, sou cidadã.

Da mesma forma que não enxerguei exagero em eu telefonar para o SAC da Coca-Cola para reclamar de 1 litro e meio do refrigerante com gosto de ferrugem. Ele não foi o único envergonhado. Porém me orgulho: foi emocionante ver o caminhão da multinacional estacionando em casa exclusivamente para trocar o produto com nota fiscal e tudo.

É, gente, vergonha alheia todos já sentiram um dia. Tenho certeza. Os famosos discursos "Você fez isso? Que vergonha!!!", ou "estou com vergonha por ele/a" são legítimos da vítima da conhecida vergonha alheia. Aliás, muito normal. Os dias que permeiam a crônica da nossa vida são fontes inesgotáveis e rendem cada história...

Prometo, em outras ocasiões, trazer a vocês, leitores, demais partes de "Vergonha alheia? Eu sinto!". Espero não decepcionar. Só não garanto que não experimentem essa sensação ao lê-las.

Lucimara Souza
Enviado por Lucimara Souza em 26/07/2010
Código do texto: T2399757
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