Sem discussão
Faz uns cinco anos sofri uma batida por trás. Subindo a D. Pedro em frente à Rádio Tabajara, uma mulher reduziu bruscamente a velocidade na minha frente, eu pisei no freio e um mané bateu atrás do meu Gol velho de guerra.
A porra da D. Pedro ainda não havia sido duplicada, o tráfego começou a enrolar, teve início um apitaço. Desci do carro pra ver o prejuízo. Era uma picape caindo aos pedaços, dessas de pegar frete. O cara já saiu chorando:
-- Doutor, isso é uma merda! Mulher dirigindo só dá nisso. Eu vi, ela freou de repente, o senhor teve que brecar também. Esse carro é meu ganha-pão, moro no Cangote do Urubu, tou desempregado, minha sogra continua na minha casa, meu nome está no Serasa e sou torcedor do Botafogo da Paraíba.
Virei as costas, entrei no meu Gol meia boca e me mandei.
Uma perua velha me tascou um processo na Justiça pedindo indenização por danos morais. No dia da audiência, entrei calado na sala e saí mudo. A velha me olhou com cara de odiosidade, mas também não disse nada.
O telefone só fazia tu, tu, tu, tu, tu, tu... Dois dias tentando falar com o cara que me devia uma grana. Avistei na rua, ele se escondeu. Fui na casa do gaiato, mandou dizer que não estava. A portadora do recado: sua mulher, um peixão do rabo grande que ficou me olhando com cara de tarada. Fui no camelô, comprei o último sucesso dos Aviões do Forró, “Todo castigo pra corno é pouco”, e mandei pro cara. Esqueci a dívida.
Mandei trocar o disco de embrenhagem do Gol. O mecânico botou artefato usado e me cobrou por uma peça nova. Fiquei olhando pra ele um instantinho, com vontade de perguntar se na minha testa estava escrito “otário”. Cabeça de Cuia era um mecânico que eu conheci. Ele cobrava o freguês dizendo um lenga lenga sem pé nem cabeça, tentando confundir o mané. Só não falava da “rebimboca da parafuseta”. Esse que trocou o disco de embrenhagem não tinha imaginação. Paguei e fui embora, tentando desviar o foco da discussão que travava comigo mesmo: tem algo mais irritante do que presenciar alguém querendo te "passar a perna? E por que a gente não reage?”
No cabaré de Carminha, em Mari, eu tomando umas cervas com um amigo. Saindo pra mijar, na volta as “meninas” botaram mais algumas garrafas vazias na mesa, pra bombar a conta. Meu amigo tentou reclamar, atraindo a atenção de Carminha, uma imensa rapariga com mais de 200 quilos de banha:
-- Quem é o veado que não quer pagar a conta?
Paguei imediatamente, ainda deixei gorjeta para as marotas mariposas.
Burro, otário e imbecil, mas calado. Somos os tais perdedores. Se encontrar com algum de nós na rua, não discuta. Nós não gostamos de polêmica, só pagamos a conta e vamos embora.
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