O Discipulo e a Angustia

Havia um mundo para mim....

Um mundo que se desenhou e se coloriu após ver aquele homem no barquinho. De pé se equilibrando no balanço das águas. Seu equilíbrio não estava no corpo, mas nas palavras, trazia consigo palavras novas, palavras doces, palavras vivas.

Eu entendi a mensagem, aceitei o convite, deixei minha vida e o segui. Não havia rumo, planejamento de ida ou de volta. Nós apenas íamos. Ir, era uma palavra que constantemente estava em seu lábios.

Fui...

Cada vez mais modificado pela convivência, já ensaiava abraços e beijos, que outrora não existiam em mim. Palavras belas saiam de minha boca de quando em quando.

Mudei meu nome; transformei-me em rocha; assisti sua glória; comi do pão multiplicado; bebi do cálice; meus pés foram limpos por suas mãos e prometi a fidelidade.

Iria até o fim, mas ele me conhecia mais do que eu mesmo.

Traí.

Abandonei.

E de longe, escondido no monte eu ouvi seus gritos de dor. Vi o céu mudar de tom, vi o mundo perder a cor e tornar-se cinza novamente.

Ele partiu, e assim também meu coração nesta despedida infiel. Não pude lhe dizer o quanto o amava, não pude cuidar ao menos de suas feridas. Fui covarde.

O cair da noite escureceu a minha alma, a negra angustia do arrependimento me fez desgostoso a cerca de mim mesmo.

Pensei em morte. Não em tirar a vida, mas por justiça de Deus que Ele me levasse daquele angustia sem fim.

Três dias sem dormir; três dias de lamento e depressão; três dias de lembrança do passado.

Lembrei-me de sua voz, do seu toque, de sua roupa, do seu cheiro, do seu cabelo, da sua mansidão e do seu amor. A cada minuto de lembrança, os olhos se lavavam das lágrimas que a alma produzia.

Três dias que duraram uma vida inteira.

Mas eu ouvi uns sussurros , pessoas balbuciavam que ele já não estava mais adormecido. Os sussurros ganharam corpo, tornou-se gritos e anúncios de que Ele ressuscitara e estava entre nós.

Meu coração palpitava sôfrego por querer vê-lo, ou evitá-lo pela vergonha. Talvez eu pudesse dizer o quando senti sua falta, ou talvez não. Quem dera perdoar-me do meu erro.

Mas talvez ele não queira me ver, talvez dirá: “apartai-vos de mim, servo infiel!”.

-Pedro?

-Eu conheço esta voz, disse eu com o peito explodindo em dor e alegria.

-Pedro?

-Era ele, reconheci pela doçura da voz e pelo perfume.

-Pedro?

-Sim Senhor, disse alegre pelo reencontro.

-Tu me mas?

-Sim Senhor!

-Pedro?

-Diga

-Tu me amas

-Sim Senhor

-Pedro?

-Eis me aqui

-Tu me amas

-Senhor, tu me conheces mais do que a mim mesmo, sabe que sofri pelo que fiz. O senhor que sondas os corações sinceros deve ter recebido todas as minhas lágrimas e súplicas de arrependimento. O Senhor Sabe que eu te amo, mais do que tudo!

- Então meu amigo, apascenta minhas ovelhas e cuidas dos pequeninos.

-Lancei-me em seus braços e o beijei.

Três vezes o neguei,três dias eu sofri, mas por três vezes fui perdoado.

Samuel Boss
Enviado por Samuel Boss em 23/07/2010
Código do texto: T2396040