RELÍQUIAS

De algumas coisas não me desfaço de jeito nenhum. Tenho guardado um dos primeiros casaquinhos que usei. É mínimo, de feltro cor de salmão, feito às pressas por uma tia, porque o enxoval herdado do irmão era grande demais. Achei nos guardados de mamãe um conjunto de calção bufante preso por botões na camisa de preguinhas, que papai usou na infância... Trouxe para cá.

Guardo chumaços de cabelo dos meus filhos, que eu mesma cortava, além dos dentinhos de leite que eles traziam ao cair, vibrando de alegria...

Por muitos anos guardei pilhas de desenhos que eles faziam, mas não embalei bem, amassaram um pouco e um dia joguei tudo fora. Depois, quase morri de arrependimento. Sobraram alguns trabalhinhos da escola, cartõezinhos do dia das mães, ou dos pais, escritos com letrinha caprichada, ilustrados e com dizeres certamente assoprados pela professora. E alguns cadernos. A pasta com desenhos das aulas de Artes do tempo do ‘ginásio’ deles está aqui.

Quando eram pequenos ainda, minhas amigas e familiares tinham mania de lhes dar canetinhas. E eles começaram, como toda criança, a rabiscar e pintar as paredes do apartamento. Foi então que eu decidi oferecer um outro presente, diferente, bem original: uma parede! Ali podiam desenhar e rabiscar o que bem entendessem. Mas só ali. Eles adoraram.

Ela ficava num quarto que virou salinha com móveis apropriados para a idade: mesinha, cadeirinhas e estante para brinquedos e livros. Ali eles assistiam televisão, reinavam, brigavam e às vezes até jantavam. E desenhavam muuuuito na tal parede, que acabou se transformando num belo e colorido painel. Que ia do rodapé até onde suas mãozinhas alcançavam, bem entendido. Durante alguns anos ele foi a atração da casa, todo mundo queria ver.

Um belo dia, porém – sempre tem que haver um porém – uma faxineira nova no serviço quis caprichar. Quando percebi, a parede estava branca. Ela havia limpado tudo, bem limpinho...