COISAS DA MEMÓRIA

Sigo pelo asfalto onde caminho todos os dias. De repente ela me aparece numa esquina. De longe, grita alegremente:

_Ei, Marina!

Entra no ritmo da caminhada. Segue ao meu lado. Tento atinar: quem é a moça? Ah, quem me dera saber! E essa agora? Cabelo claro, meio gordinha, olhos esverdeados. Quem é você, enigma? Onde mora? Qual é seu nome? Não posso perguntar. Não depois dessa alegria com que veio a mim. Ficaria sem graça. Digo sem o entusiasmo que ela talvez espere:

_ E aí, tudo bem?

_ Tudo... Bom te encontrar! Fazendo uma caminhadinha?

_ É, é o jeito, né?

_ Tanto tempo a gente não se vê, hein? Cê tá morando no mesmo lugar?

Hã? E agora? O mesmo lugar, será qual? Faz cinco anos que mudei de casa. Vasculho meu cérebro. Socorro! Em que tempo essa ilustre desconhecida fez parte do meu mundo? Arrisco:

_ Moro, moro no mesmo lugar!

Ela não desiste:

_ Eh, Marina, bons tempos aqueles, hein? Não me esqueço...

O quê? Que tempos? Jesus, que será que fizemos de tão bom? Pra ela não esquecer, deve ter sido coisa muito boa mesmo... Completamente no escuro confirmo:

_ Bom, muito bom aquele tempo!

_ Cê casou com aquele seu namorado?

Ai, ai, ai! Com qual, gente? Penso nos ex-pretendentes a maridos da minha vida. Jogo no bicho, deixo assim meio vago. Não quero comprometer ninguém.

_ Pois é, casei...

_ Eu também casei com o Tico...

Tico? Que Tico? Consulto meus arquivos “Vai, Marina, que Ticos, você conhece?”. Descubro uma novidade: em meu modesto universo não existe nenhum. Nem Tico nem Teco. Bem lembrado. Tico é um nome tão simples. Preciso dar um jeito de conhecer algum Tico... Ah, deixa pra lá... Ela prossegue:

_ Bom, mas também já descasei. O Tico era à toa demais... Precisa ver que boa bisca ele me saiu. Com toda aquela carinha de anjo...

Mentalmente peço perdão ao Tico.

_ É? Pois é... Que danado, hein?

_ Ah, mas boa mesmo era a turminha da gente, né?

Hum, então tivemos uma turma. Mas que turma? Alguma do colégio? Quem sabe a do pré-primário. Só podia ser, pra eu não me lembrar de nada desse jeito...

Pistas! Pistas! Que idade ela teria? Ah, não! Para já com isso, Marina! Você é um desastre tentando avaliar idade. Pois é... Tô fora dessa armadilha, desde o dia em que dei cinquenta e dois para um rapaz de trinta e nove. E olha que o coitado esperava uns trinta, eu acho.

Por fim, ela chega ao fim do desconfortável inventário. Um abracinho rápido e diz:

_ Bom, agora vou virar por aqui. Tô indo ali na horta comunitária comprar verduras. Falar em verdura, cê ainda gosta de mostarda? Adorava mostarda com polenta, arroz e feijão, lembra?

Essa não! Ah, essa não! Tanta intimidade assim já é demais! Ela acena e some na esquina. Ué, gente, de repente me deu uma vontade enorme de comer mostarda com polenta, arroz e feijão! Essa menina me conhece mesmo...

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Marina,poetisa querida

A menina de tudo lembrava

E você,sem ver uma saída

Com a danada concordava

Mas,amiga não é culpada

Talvez ela,bem enganada

Esse papo todo puxava!

Já aconteceu comigo

De uma mulher me agarrar

Até torceu meu umbigo

De tanto mesmo me apertar

Gritava:"Você é o gostosinho

Aquele tal de Pedrinho

Que a Marina sempre vai visitar!

(Pedrinho Goltara)

( Ih, Pedrinho acho que sua situação foi mais complicada que a minha rsrs. "Brigada" pela interação com toque de seu bom humor!)