A volta do poeta fluvial

Eliel José Francisco veio de Paulista para visitar Itabaiana, sua querida terra natal. Chegou trazendo debaixo do braço um catatau de versos que traduzem seu bem querer nativista, invocando o passado e tomando cachaça nas barracas do Carritel e do Cochila. “O passado é uma carga pesadíssima, e para carrega-lo tem que tomar cachaça com caju e pitomba”, acredita o poeta Eliel. De vez em quando ele sente a urgência de visitar Itabaiana, ver seu rio Paraíba onde nadou feito piaba nas cheias de antigamente.

Como nas epopéias antigas, Eliel quer perpetuar em seus poemas, por todos os tempos, o destino de um povo sem muito destino. “Minha poesia é ‘Os Lusíadas’ do pé-rapado, do fuleiro que toma cana e leva tapa da polícia, do zé-ninguém que leva chifres da mulher e se vinga no mel podre da ponta de rua”. Mas ele é capaz de fazer versos tão bonitos como este:

“...foi em legítima defesa

Que eu matei a saudade...”

Professor de inglês, Eliel José Francisco fala mesmo é a língua da Maloca, do Cochila e do Apertado da Hora. “Passei a escrever versos fesceninos, porque em geral o povo gosta de sacanagem”, explica o poeta. “A prova disso é que votam sempre nos mesmos políticos feladaputistas”, raciocina. Eis alguma coisa nesse gênero:

Que saudade da Quixola

Lá do alto do Cochila

Aonde eu jogava bola

Com o nome de “Quizila”.

É a ausência do gosto

Da boceta de Maria

Que esfregava no meu rosto

O bocetão todo dia.

Eu que não era um jumento

Era apenas um menino

Até hoje inda lamento

Dessa boceta o destino.

Porque eu amo a xoxota

E o gosto do perino!

Como qualquer poliglota

Que não é fresco ou cretino.

Também em louvor à dona vulva, Eliel gosta de declamar:

Diz Eliel lá na feira:

Não és tu, Deus, que governas.

É essa caranguejeira

Que a mulher tem entre as pernas.

Rezando na matriz da Conceição, o poeta pediu:

Ó milagroso Jesus!

A vós só peço justiça.

Fazei com que minha cruz

Seja feita de cortiça.

Nessa última visita, o poeta mandou ver umas estrofes me elogiando, que eu fiquei até tomado por sentimento de gratidão pelas palavras do Eliel, pois o Estatuto do Idoso permite ao velho receber bajulação explícita e caridosa sem ficar acanhado.

Disseram que eu sou poeta

Amante da poesia

Um rimador e esteta

Perfeito na ritmia.

Entretanto, ao ler os versos

Do grande Fábio Mozart,

Nos ritmados processos

E de rima singular,

Pensei: sou meio poeta

Das liras de Itabaiana

Ou, na verdade, um pateta

Que com versalhada engana.

Mas seja lá como for,

Na limitação da lida,

Eu canto com muito amor

Itabaiana querida.

www.fabiomozart.blogspot.com

Fábio Mozart
Enviado por Fábio Mozart em 20/07/2010
Código do texto: T2388367