NÃO ERA HORA DAQUILO

Ultimamente tenho dedicado algumas horas a procurar umas músicas tão cantadas muito tempo atrás e desaparecidas completamente das paradas. A música de boa qualidade está numa crise braba. Quem não achar pode dizer o contrário. Eu digo que é a que eu me acostumei a gostar e estaremos resolvidos na preferência pessoal. Os grandes compositores estão numa espécie de férias, eu quero crer. Dos novos talentos posso destacar muito poucos. Uma hora vou falar deles.

As músicas que marcaram época nos foram apresentadas pelos grandes festivais que existiram num passado muito fecundo de idéias e efervescência cultural no mundo e o Brasil foi um celeiro de grandes manifestações. Embora esta última frase que fiz pareça um artigo cheio de clichês de crítico de arte, é a mais apropriada que encontrei. Música também sempre foi associada a movimentos, a vanguardas, uma espécie de abrigo às idéias que circulam no mundo. E a nossa tumultuada última metade do século vinte ofereceu um prato cheio à criação.

As músicas de protesto contra a moral e os costumes abrigaram-se no Tropicalismo. Aquelas que protestavam contra o regime político ganharam o país como verdadeiros hinos clandestinos de uma geração engajada nos movimentos de transformação e rebeldia; “os subversivos” como eram saudosamente chamados quem compunha e quem ousava comprar disco deles. (Êta saudade de uma subversão!). Chegamos a ter um policiamento entre os próprios artistas, isolando-se os românticos, considerados alienados de um lado, na jovem guarda, e os subversivos engajados de outro, no Tropicalismo. E tinha os independentes ou marginalizados pelos dois lados. Vejam um exemplo: Antônio Carlos e Jocafi eram uma dupla adorável de baianos, produziam uma espécie de samba canção lento e delicioso. O mais notável e mais conhecido foi VOCÊ ABUSOU, onde, numa analogia poderiam estar se defendendo da condição de alienados ou fazendo apenas um protesto a uma amada intelectualizada. Pra um bom entendedor, uns versos bastam:

“...me perdoem se eu insisto nesse tema, mas não sei fazer poema ou canção que fale de outra coisa que não seja o amor.”

“Se o quadradismo dos meus versos vai de encontro aos intelectos que não usam o coração como expressão...”

Por onde andarão? Eles eram muito bons, mesmo.

Vandré, caminhando e cantando, conformou-se com a derrota numa final de competição musical dizendo que “a vida não se resumia a festivais.” Chico e Jobim foram sonoramente vaiados como vencedores com a romântica “Sabiá” num festival. Mal interpretada pelo público, que não entendeu as metáforas da letra da canção. Estes são, no entanto, um caso à parte. Transitavam bem em qualquer modalidade, estilo, nota e melodia. Até o Raul Seixas entrou na rebeldia, ele que era rotulado um eterno rebelde de outra galáxia, acabou dizendo que, no fundo, no fundo, todo mundo queira mesmo era vender discos:

“ Mas é que agora pra fazer sucesso, para vender disco de protesto, todo mundo tem que reclamar?...”

Quanta saudade!

josé cláudio Cacá
Enviado por josé cláudio Cacá em 20/07/2010
Código do texto: T2388366
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