Noutro dia...
Somente 10 minutos de reflexão, sintetizando quase uma vida toda, nos levam a percorrer caminhos norteadores dos nossos sentimentos, quando o devaneio e a melancolia se apresentam de modo avassalador.
Aconteceu em 09 de maio, no interior de um vagão do metrô, totalmente lotado, ao regressar da Academia Brasileira de Letras, onde acabara de assistir a última palestra do 2º Ciclo de Conferências dos Fundadores da ABL. A gentileza de um jovem aparentando uns 20 anos foi responsável por esse magnífico estágio sentimental.
- "Senhor, por favor, sente-se aqui”, disse-me ele, pegando o meu braço com cuidado, talvez por haver constatado o Mal de Parkinson, do qual sou portador, após levantar-se e afastando-se da namorada, que demonstrou concordância com o seu nobre gesto.
Então, de maneira efêmera, agradeci a Deus por receber a graça de vivenciar aquele momento sublime o qual, para mim, definia o início da velhice, fato que se confirmaria dois dias depois, 11 de maio, quando completei 65 anos.
Ao mesmo tempo, um grande pessimismo apoderou-se de mim. Novamente invoquei o nome de Deus, incrédulo. – "Deus meu, já estou velho, em breve serei um ancião”. Envolvido pela emoção, retornei ao passado.
“Noutro dia, em 1974, com o vigor dos meus 33 anos, após o período de 12 horas na direção de um táxi, carreguei no colo a passageira grávida, já na entrada de um hospital no Rio de Janeiro”. “Noutro dia, em dezembro de 1980, era pai pela terceira vez”. Hoje o meu filho concederá também o lugar no ônibus para um velho que, possivelmente, pensará como eu. É o ciclo da vida.
Agora, diante dessas reflexões, devo conscientizar-me com mais profundidade, de que a vida é bela e gratificante, razão pela qual permanecerei ponderando e relevando, quando possível, o procedimento daqueles que são desprovidos de tolerância e se julgam superiores a seus semelhantes. Afinal, noutro dia, em 1990, encontrava-me na cidade do Rio de Janeiro, com toda a saúde, oferecendo aos idosos o meu lugar no trem. E noutro dia...