Sublime beleza
O sol rompia a manhã do Éden quando o Criador num ato de sublime inspiração, da costela de Adão criou a mulher. Estrela da manhã, cristal de luz. Clara como o dia.
Abriu ela os olhos ao sopro de ar com que Deus encheu de vida os seus pulmões, e viu o varão que ainda dormia na tenda do dia, perdendo a hora, posto que deitado em sono profundo nem vira o dia amanhecer.
Num gesto óbvio, de chofre, sacudiu seu semelhante como a querer explicação da visão que tinha naquele momento. Viu o corpo nu do homem, iluminado ao sol e docemente chorou duas lágrimas; as primeiras da história da mulher. Foi um choro de alegria, feliz da companhia que tinha naquela imensidão desabitada. Nada entendia de lógica ou de razão, simplesmente viu ali a sua junta. De repente, do seu coração ainda a ser entendido, brotou um sentimento em grau incomum - mesmo aos dias de hoje - pelos olhos do dono do pomo. Nascia a ciência de uma afetividade intensa; de um ser capaz de sentir em profundidade as impressões do mundo, fazendo que delas participe toda a sua pessoa. E, emotiva, ansiou ser tratada com o mesmo carinho.
Ele arregaçou as pálpebras estupefato diante do que tinha à sua frente, e viu a sublime beleza sobre a qual jorrou a libido de que ainda não tinha ciência. Foi assim, o primeiro olhar que a ela dirigiu. Intimamente e tão de repente, um conjunto de processos e fatos psíquicos atuou sobre a conduta de Adão. Aflorou, entretanto, nos seus sonhos, nos seus atos, nos seus nervos; algo tão fugaz ao domínio, que não podia ser domado por nenhum esforço da vontade. Um quase instinto tão sujeito à tentação enquanto a consciência não estivesse sentinela.
O amor foi assim concebido e dividido entre o amor do homem e o da mulher desde o princípio. Algo que não se sabe se obedeceu ao desígnio da criação ou se, no entanto se estabeleceu em conseqüência da seqüência genética.
De tudo, o que se pode supor é que o amor da mulher é o que mais se aproxima da intenção, sabendo-se ela, originária da perfeição. Quanto ao homem, desde o patriarca vem buscando, e haverá de procurar eternamente por esse amor com quem certamente se encontrou ao longo desse caminho, sem, contudo, reconhecê-lo grandioso, magnífico, esplêndido, encantador; divino.