Memorias afetivas
" As pessoas não morrem. Ficam encantadas”.
Guimarães Rosa
Enquanto arrumava os lençóis da minha cama, lembrava do dia que minha adorada mãe como era de costume, vinha conversar comigo nas tardes de domingo. Numa dessas tardes, lembro que certa vez, ela apenas me ouvia e nada falava e ao passo que me escutava, apenas olhava-me nos olhos com ternura e zelo que tem toda mãe.
Fitei meus olhos nos dela, belisquei seu pensamento e naquele instante, o eterno se fez em minha memória. Então, quando perguntei o porquê de tanto silencio, ela apenas me disse:
“- É preciso saber ouvir, parar, silenciar. Nem sempre devemos pronunciar o que pensamos, porque às vezes, nossos pensamentos são falhos, nos enganam e até pregam peças em nossa vida.”
Contudo, mais uma vez aprendi que a serenidade nos faz bem, porque em outras palavras, no dado momento em que se deu nosso diálogo, foi isso que ela quis me dizer: que acalmasse meus pensamentos, que calasse meus enganos...
Como minha mãe me ensinou!
Este é apenas um dos incontáveis exemplos dos quais, fazem parte das minhas memórias afetivas, penduradas nas paredes do coração. Memórias que gosto de ter, bálsamo à saudade que mora em mim.
Penso que pessoas encantadas são assim, permanecem presentes, vivas, na saudade, na lembrança, com uma energia que ilumina cada espaço onde sombreia a esperança de nos encontrarmos novamente.
Ao terminar de arrumar a cama, abri o álbum de fotos da família e minha alma percorreu cada paisagem de alegria, de sonhos partilhados, historias vividas, imagens que o tempo não pode apagar.
Assim, quando me dei conta, dos meus olhos escorregaram gotas de amor que banharam cada lugar onde afaguei a eterna saudade.
Por fim, creio que a vida, nunca deixa de ser, quando sempre foi de verdade, com equilíbrio, serenidade e sabedoria. Por isso, as pessoas, como o Guimarães Rosa, bem colocou, não morrem, ficam encantadas, perpetuadas na história construída, trilhada, ficando as marcas indeléveis pelo bem que fizeram, no que se plantou e semeou com amor, em cada gesto, palavra, no testemunho da vida.