Biu Pacatuba – uma contribuição à documentação das lutas populares
Manoel Batista*
A tentativa de organização dos trabalhadores rurais através das Ligas Camponesas na região de Sapé e Mari no final da década de 50 e início de 60 resultou numa das ocorrências históricas mais importantes do século passado no Nordeste. Os líderes do movimento conseguiram uma tal validez em suas lutas que chegaram a incomodar os Estados Unidos, que mandou seus quadros de espiões e seus programas de contrarevolução para atuar nas áreas conflituadas. Dois presidentes da República foram até Sapé para conhecer de perto aquele Brasil que ainda vivia a realidade da escravidão. No fim, as forças reacionárias do latifúndio acabaram vencendo os pobres e analfabetos integrantes das Ligas Camponesas.
Ao completar 50 anos, as Ligas Camponesas não mais existem enquanto associação de classe, mas o espantoso e anacrônico mundo do Nordeste rural pouco mudou. Não veio a reforma agrária tão ansiada pelos trabalhadores sem terra, mas restou um dos mais cruéis e violentos castigos físicos e morais já aplicados contra uma classe social no país pelas forças da repressão, depois do golpe militar de 1964. Líderes camponeses foram mortos, torturados ou exilados.
Buscando nos sites da internet, não encontro nenhum texto que fale de um daqueles mártires, o primeiro presidente das Ligas, o sapeense Severino Alves, o Biu Pacatuba. Os estudos sobre o tema não certificam a presença e ativismo de Biu Pacatuba ao lado de João Pedro Teixeira, Pedro Fazendeiro, Ivan Figueiredo, Elizabeth Teixeira e outros mentores do movimento, personagens que deram um papel político importante ao campesinato antes de 64, e depois na luta clandestina e na resistência à ditadura.
O Governo Lula sancionou o projeto que anistiou Biu Pacatuba. Um reconhecimento póstumo ao homem que foi um dos que inspiraram e orientaram as Ligas. Com a anistia, o Estado brasileiro legitima o movimento e dá visibilidade a esse herói do povo. Impõe-se como ator da História e agora ganha destaque com a publicação do livro “Biu Pacatuba, um herói do nosso tempo”, de Fábio Mozart, que sai pela “A União Editora”.
Apesar do farto material sobre as Ligas Camponesas, só agora ao completar 50 anos o movimento recebe um trabalho que reconhece a importância da personagem Biu Pacatuba. E vem em forma de folheto de cordel, que era a forma de comunicação daqueles tempos na zona rural. Revela novos ângulos sobre a história, divulgando as ações daquele movimento social sem condicionamentos da ideologia dominante da sociedade de classes, apesar da visão marxista ortodoxa, se bem que de forma renovada.
De quebra, o livro encarta “Mari, Araçá e outras árvores do paraíso”, história da cidade de Mari em versos, além de perfis de personalidades marienses. É, portanto, uma obra fundamental também para a minha comunidade, e eu farei pessoalmente o maior esforço para divulga-la, principalmente nas escolas. É importante que as novas gerações tomem conhecimento dos movimentos sociais de sua terra, para que eles, os homens e mulheres que farão o futuro, possam ter uma visão não deformada da História, para que ajudem a impulsionar efetivas mudanças nas relações sociais de Mari, de Sapé, da Paraíba e do Brasil como um todo.
* Diretor de Cultura de Mari/PB