Parece futebol
PARECE FUTEBOL
(crônica publicada no jornal "Diário Catarinense" de 30.06.2010)
A ressalva aí do título até que tem lá a sua justificativa: parece futebol, mas não é. Isto porque há leitores que detestam textos sobre futebol, e passam batidos por eles. Há escritores que detestam futebol, e acreditam que o exercício das letras é por demais nobre para se entreter com o vulgar exercício da bola. Como se a Literatura não se ocupasse do homem como um todo, do povo em qualquer das suas manifestações. Como se o futebol, além de um baita negócio, não fosse também uma forma autêntica de expressão das pessoas, que influencia suas decisões, afeta seus relacionamentos e condiciona suas reações.
Outro dia recebi a mensagem eletrônica de um escritor que mantém seu blogue na Internet. Convidava-me para publicar naquele espaço virtual crônicas e contos de minha autoria, desde que não mandasse absolutamente nada sobre qualquer esporte: ele não admite textos esportivos; com relação à política, também tem suas restrições: só recebe e publica textos que falem mal do Lula ou do PT. Ou de ambos, preferencialmente.
É verdade, reconheço, que, com um título tão direto como o desta crônica, afastarei os leitores de futebol, aqueles que devoram tudo sobre o esporte ainda que seja para discordar radicalmente do cronista. Submeto-me, conformado, a tamanho e tão prejudicial risco. Afinal, é impossível agradar a avaianos e figueirenses quando se escreve sobre futebol.
Mesmo não sendo sobre futebol, embora pareça ser, o assunto é Copa do Mundo. Na noite da segunda-feira em que escrevo este texto, já são três as seleções sul-americanas classificadas paras as quartas-de-final. Com chances de o Paraguai entrar terça-feira nesse seleto grupo de oito equipes. Isto permite pensar que é possível restar apenas o Mercosul nas semifinais do torneio.
O futebol milionário dos badalados campeonatos europeus (França, Itália, Inglaterra e Espanha, esta cambaleando) desapareceu do mapa este ano. Com tanto dinheiro, os colonizadores "compram" das colônias jogadores aos montes, como gladiadores - os escravos para as arenas de Roma -, e esquecem, eles próprios, de aprender a jogar. A Alemanha é a exceção que limita o número de estrangeiros nos seus clubes.
É como o cinema, a música e a literatura: se só vemos, ouvimos e lemos o que vem de fora, desaprendemos de gostar do que é feito aqui. E não por uma questão de qualidade, até bem pelo contrário.
(Amilcar Neves é escritor com sete livros de ficção publicados, diversos outros ainda inéditos, participação em 32 coletâneas e 44 premiações em concursos literários no Brasil e no exterior)