Ardia. Não sabia o quê, nem onde. Em algum lugar que buscava no silêncio, de olhos abertos para o nada. Um lugar que podia ser em qualquer parte. Um lugar inexprimível, do qual não havia pontos, pontas, lados. Só a sensação da ardência. Ardia. Ardia ou queimava?
Talvez fosse a surpresa. Quem sabe um mal súbito que espreitava à sombra aguardando o momento certo para assaltá-la. Seria tempo de morrer? Seria um prenúncio de morte, aquela estranha sensação que a farejava como um cão faminto? Ou ela mesma farejava o ar em busca de alguma coisa que não havia?
Talvez fosse medo. Uma informação mal decifrada que alertava sobre um falso risco iminente. Mas de onde vinha? Por que teria surgido ao acaso, assim, repentinamente, feito uma abelha zangada a investir sobre seu verdugo?
Que mais poderia ser? Ardia, queimava, bulia com tudo o que tinha e era. Deveria se preparar para possível dor? E que dor estaria por vir? Ou, seria a loucura? Preocupação insossa, suspeita infundada. E a sentinela fiel, que a ensombrava, que a preservava com o cuidado de um escravo, que a alertava, quem, ou o quê seria? Um sexto sentindo? Um anjo? A própria alma?
Ardia. Queimava. Um certo sabor de angústia lhe apertava o peito. Angústia ou aflição? Talvez, mais agonia. Impaciência. Também susto. Onde ia parar aquilo? O que fazer para se salvar? Ou para se livrar daquela teia, daquela rede de sensações, aranhas bizarras, que a tornavam tão dócil presa?
Estaria perdida em que mundo? Qual idioma falava, em suas entranhas, seu coração, sua alma, nela inteira, aquele sentimento estrangeiro, completamente desconhecido, que a levava, talvez, para sempre? Ardia. Queimava... Por um inexperiente, incógnito e novíssimo, amor.